Panorama internacional

Analista: conflito na Ucrânia e guerra em Gaza afetam o equilíbrio político na União Europeia

Ucrânia e Gaza parecem ter impulsionado a ascensão dos partidos conservadores europeus antes das eleições parlamentares da União Europeia (UE) de 2024, enquanto o establishment liberal está perdendo controle, afirma especialista.
Sputnik
A vitória do político populista de direita, Geert Wilders, e de seu Partido da Liberdade (PVV, na sigla em holandês) nas eleições gerais holandesas da semana passada (22) foi descrita como "chocante", "surpreendente" e nada menos que "pesadelo" pela grande imprensa ocidental.
Na verdade, Wilders personifica tudo o que o establishment liberal da UE despreza: ele é um eurocético fervoroso; é anti-imigrantes; ele alerta contra a "islamização dos Países Baixos"; apela à suspensão da ajuda à Ucrânia; e, por fim, se opõe à "russofobia histérica" na Europa.
No entanto, o que impressionou os observadores foi que, não muito tempo atrás, o PVV de Wilders obteve apenas 10% dos votos, mas desta vez conseguiu obter 37 dos 150 assentos do parlamento com 25% dos votos expressos.
David Paul Goldman, um estrategista econômico e autor norte-americano, sugeriu que o ataque surpresa de 7 de outubro por parte do Hamas e as subsequentes manifestações pró-Palestina em toda a Europa contribuíram para a vitória de Wilders. O estrategista chamou as manifestações de "uma afirmação triunfalista de poder por parte de uma minoria que acredita que pode se tornar a futura maioria".

"A migração, legal e ilegal, está transformando o caráter da sociedade europeia. Oficialmente, cerca de 7% das populações da França, Reino Unido e Alemanha são migrantes muçulmanos, mas os números reais são mais elevados", observou Goldman no seu último ensaio para a Asia Times.

Um sentimento anti-imigrante, promovido pelos partidos conservadores europeus, recebeu um impulso adicional em outubro, após o ataque do Hamas, segundo o autor. Ele observou que a direita europeia apoia amplamente Israel.
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Antes da crise de Gaza, a tendência era impulsionada pelo conflito na Ucrânia, segundo Goldman. Os partidos conservadores europeus sinalizaram ceticismo em relação ao fato da UE gastar milhões para armar a Ucrânia, bem como às sanções anti-Rússia que saíram pela culatra no setor energético europeu.
Assim, na Alemanha — a economia do G7 (grupo composto por Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido) que entrou oficialmente em recessão no primeiro trimestre de 2023 — os partidos de direita registraram um aumento na popularidade desde o início do conflito na Ucrânia. O partido Alternativa para a Alemanha (AfD) tem atualmente 21% de votos, ficando atrás apenas da aliança entre a União Democrata-Cristã e a União Social-Cristã (CDU/CSU) que detém 30%, e ultrapassando o Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD), com 16%. Já os Verdes têm 14%, o Partido Democrático Livre, 5% e a Esquerda, 4%.
A AfD é abertamente contra a guerra por procuração ocidental na Ucrânia.
"Estamos neste momento sacrificando a juventude ucraniana nesta guerra idiota: uma guerra que poderia facilmente ter sido evitada", disse o líder da AfD, Maximilian Krah, membro do parlamento da UE ao The American Conservative no final de outubro. Para ele, o conflito é "sobre a ambição da América de reagir contra a Rússia [...]. É uma guerra pela ordem mundial", disse ele.
Este ceticismo é partilhado pelo também conservador primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, que há muito se opõe à militarização da Ucrânia e recentemente ameaçou bloquear toda a ajuda da UE à Kiev, a menos que os líderes do bloco revejam toda a sua estratégia com o país.
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"O Conselho Europeu deveria fazer um balanço da implementação e eficácia das nossas políticas atuais em relação à Ucrânia, incluindo vários programas de assistência", escreveu Orbán em uma carta dirigida ao chefe do Conselho Europeu, Charles Michel, no início desta semana (20).
Uma pesquisa de setembro realizada pelo Instituto francês ViaVoice indicou que o partido de direita Rassemblement National (Reagrupamento Nacional) de Marine Le Pen também está ultrapassando seus rivais políticos em termos de confiança dos eleitores, com 20% dos entrevistados dando apoio aos ultraconservadores franceses, 15% apoiando o partido liberal do presidente Emmanuel Macron Renaissance (Renascimento), enquanto a coalizão de esquerda NUPES e a conservadora Les Républicains (Os Republicanos) obtiveram 14% e 13%, respectivamente. Le Pen tem criticado consistentemente Macron pelo seu belicismo em relação à Ucrânia e alertado contra um possível conflito direto com a Rússia.
É preciso admitir que o sentimento antiguerra europeu em relação à Ucrânia não é impulsionado apenas pela direita europeia. O partido de esquerda Smer, liderado pelo antigo primeiro-ministro eslovaco Robert Fico – que submeteu repetidamente a militarização de Kiev a duras críticas – saiu vitorioso nas eleições de setembro no país.
No entanto, a ascensão da direita está ocorrendo antes das eleições para o Parlamento Europeu de 2024, que estão programadas para 6 e 9 de junho. O tempo dirá qual será o equilíbrio de poder após a votação, afirmou Goldman.
"À medida que as placas tectônicas da política europeia mudam, nenhuma das velhas 'palavras mágicas' se aplicará", concluiu o especialista.
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