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Tomar partido em conflitos internacionais dificulta papel do Brasil como 'mediador', dizem analistas

© Foto / Agência Brasil / Lula MarquesMinistro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, durante audiência pública na Comissão de Relações Exteriores do Senado. Brasília, 14 de março de 2024
Ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, durante audiência pública na Comissão de Relações Exteriores do Senado. Brasília, 14 de março de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 14.03.2024
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Especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil entendem que o Brasil, mesmo com seu histórico de neutralidade, sob a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tem tido posições e feito escolhas que geram uma reação por parte de opositores, o que dificulta o papel de "mediador" de conflitos.
Nesta quinta-feira (14) no Senado Federal, o ministro de Relações Exteriores brasileiro, Mauro Vieira, afirmou que o país defende que haja solução de paz no conflito entre Israel e Palestina, mas entende que os israelenses tiveram uma "reação desproporcional".
Ele foi convidado pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL) para prestar esclarecimentos sobre as políticas diplomáticas do país em meio a conflitos internacionais.
Em entrevista cedida à Sputnik Brasil, o professor de relações internacionais do Centro Universitário Internacional (Uninter), Rafael Pons, opina que a defesa de Lula na criação do Estado palestino e nas críticas contundentes ao governo de Benjamin Netanyahu trazem custos políticos na política externa e interna em meio a uma queda na popularidade do petista.
Segundo Pons, eleitores brasileiros estão cientes da posição brasileira em conflitos internacionais, como o da Ucrânia e a situação com Israel.
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Sobre a alegação de genocídio, o professor observa que as críticas surgem não apenas da base eleitoral evangélica de Lula, mas também de outros setores da sociedade. "Isso mostra como Israel, até certo ponto, é favorecido, preferido pelos eleitores brasileiros."
Pons sugere que defender a Palestina pode ter sido uma estratégia para se alinhar com o eleitorado de esquerda, mas não produziu ganhos significativos. "Provavelmente os assessores do presidente Lula estão cientes disso. Eles fizeram um cálculo político."
Fernanda Gonçalves, professora de relações internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e do Centro Universitário La Salle do Rio de Janeiro (Unilasalle-RJ), destaca que a ida do chanceler ao Senado Federal foi uma estratégia política para antecipar críticas da oposição ao governo de Lula, que enfrenta crescente rejeição nas pesquisas.
Ela ressalta que o Brasil adota uma postura diplomática, buscando equilibrar interesses e defender a criação de um Estado palestino.
"É uma posição equilibrada, uma posição diplomática de defesa de que seja criado um território para a Palestina e que sejam encerrados os conflitos para que a região ali possa viver em paz."
Não se trata de uma posição nova, segundo a especialista.
"É importante lembrar que o governo Lula já defende há bastante tempo a criação de um Estado palestino. O que agora tem de forma muito clara e nítida é uma posição do Brasil mais dura com relação a Israel, mas que não é uma posição única do governo brasileiro, mas também de outros membros da comunidade internacional."
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A professora também analisa o impacto das declarações de Lula sobre a capacidade do Brasil de mediar o conflito, observando que as críticas do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu comprometeram a neutralidade do país e dificultaram sua atuação como mediador.
"Posicionar-se como mediador nessa questão vai ser cada vez mais difícil, principalmente diante das críticas que o governo brasileiro, e em especial o presidente Lula, teve de Netanyahu por conta das declarações."
Em âmbito internacional, o professor Rafael Pons, por sua vez, defende uma política externa brasileira mais cautelosa e pragmática. "Historicamente, o Brasil tem mantido neutralidade em algumas questões contenciosas. Isso é evidente na história de nossa política externa."
"Mesmo que o Brasil tenha boas relações com os Estados Unidos, qualquer país que tome uma posição clara, definida e até mesmo ideológica, seja a favor da Palestina ou contra, reflete mal", afirma Pons, enfatizando que muitos países optam por permanecer neutros.
Para ele, não apenas a base eleitoral de Lula pode ser afetada em situações como esta, como também no reconhecimento do Brasil como um país capaz de mediar conflitos.
"O Brasil precisa assumir posições mais neutras que inspirem confiança tanto na Casa Branca quanto nos demais países", opina.
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Na fala desta quinta-feira, o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, também afirmou que o país mantém um "canal aberto com Kiev e Moscou", ressaltando o papel brasileiro em encontros com líderes da Ucrânia e Rússia em busca de uma solução de paz.
Para Fernanda Gonçalves, o Brasil, desde o início do conflito, também não tomou posições pró-Rússia ou pró-Ucrânia, ainda que haja críticos que afirmam que Brasília estava mais alinhada com Moscou, devido a declarações anteriores de Lula e das dificuldades para conciliar um encontro com o presidente ucraniano, Vladimir Zelensky, na agenda.
"Mas o próprio Mauro Vieira já fez vários esclarecimentos, algumas vezes, dizendo que a posição do governo brasileiro oficial é uma posição também de buscar uma saída diplomática", ressalta a professora, comentando que a posição brasileira também defende que não haja um isolamento da Rússia, e sim um diálogo.
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Ainda assim, ela entende que, com o passar do tempo, a posição de "mediador" de conflitos tem sido cada vez mais esvaziada. "A posição que o Brasil queria exercer de mediador foi se esvaziando ao longo do último ano pela própria dificuldade de diálogo com ambas as partes para a resolução pacífica."
Para o professor Rafael Pons, o Brasil não adotou uma posição agressiva em relação à Rússia, mas defendeu um cessar-fogo, mantendo postura neutra. "O Brasil não atacou veementemente a Rússia de [Vladimir] Putin; por outro lado, pediu um cessar-fogo. Então o Brasil assumiu um posicionamento neutro."
Ele relata uma tentativa da Alemanha de incluir o Brasil no lado ocidental favorável à Ucrânia, mas que o Brasil rejeitou ao se recusar a vender munição para determinados veículos de combate alemães. "Em algum momento, podemos perceber uma tentativa da Alemanha de tentar incluir o Brasil sob o lado favorável do Ocidente, de defender a Ucrânia."
Isso, segundo Pons, aproximou o Brasil da Rússia, especialmente considerando as coalizões, como o BRICS, das quais os países fazem parte.
"Claro que o Brasil vem reiterando uma série de documentos, mostrando a necessidade de um cessar-fogo. Aliás, o Brasil tentou passar uma resolução no Conselho de Segurança, mas foi barrada pelos Estados Unidos — o que, de certo modo, foi uma pequena vitória para a diplomacia brasileira."
Pons entende que a retórica anti-imperialista de Lula pode complicar a situação tanto no cenário doméstico quanto internacional. Ele ressalta a importância de uma política externa mais cautelosa, observando que a diplomacia é o único recurso disponível para o Brasil, dada a sua falta de poder excessivo.
O professor destaca ainda os esforços do Brasil para se posicionar entre o Ocidente e a nova ordem mundial, o que foi destacado por Mauro Vieira, buscando reformas no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) e participando de coalizões flexíveis.
Por fim, ele observa que o Brasil está tentando construir novas regras internacionais, desafiando a hegemonia existente, enquanto também busca fortalecer suas relações no espaço sul-americano, especialmente por meio do Mercosul.
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