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Economista aposta em entrada da Bolívia no Mercosul até 2024; quais as vantagens para o bloco?

© Rafa Neddermeyer/Agência BrasilPresidente da Bolívia, Luis Arce, após reunião com os demais presidentes dos países da América do Sul no Palácio do Itamaraty. Brasília, 30 de maio de 2023
Presidente da Bolívia, Luis Arce, após reunião com os demais presidentes dos países da América do Sul no Palácio do Itamaraty. Brasília, 30 de maio de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 10.10.2023
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Era 2017, um ano depois do impeachment de Dilma Rousseff, quando o Congresso Nacional recebeu o projeto que permitiria a entrada da Bolívia no Mercosul. Três anos antes, parlamentares dos demais países do grupo — Argentina, Paraguai e Uruguai — já haviam concluído a votação. Tensões políticas, pandemia e relegação do bloco atrasaram o processo.
Faltava apenas o Brasil. Mas, nos últimos seis anos, o panorama não ajudou e as discussões ficaram em último plano. Para além dos problemas internos, o economista e professor titular da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás), Sérgio Duarte de Castro, disse à Sputnik Brasil que a legislação nacional é mais complexa que a dos vizinhos nessa questão.
"Demoramos muito mais até para mandar ao próprio Congresso [o projeto]. Há todo um trâmite interno, com necessidade de opinião, participação de vários órgãos, de tal forma que o Brasil só encaminhou a solicitação em 2017, quando já havia sido aprovado o ingresso da Bolívia pelos demais países", explica.
Na sequência, veio a eleição do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em 2018, que já expressava na campanha a ideia de relegar o Mercosul em prol de maior aproximação com os Estados Unidos — na época, comandado por Donald Trump.
"Tivemos um governo que não entendia a importância do Mercosul para o país e o continente. Bolsonaro chegou inclusive a cogitar em 2020 a retirada do Brasil do bloco. Então, isso tudo contribuiu para atrasar, para que essa discussão não prosperasse no Congresso", acrescenta.
Outro problema, segundo o especialista, foi o histórico político-econômico da Bolívia, que desde 2006 vinha sendo governada pela esquerda, com exceção de um curto período entre 2019 e 2020. Na época, houve o pedido de prisão do então presidente Evo Morales por militares e, com isso, ele precisou renunciar e até deixar o país, enquanto Jeanine Áñez se autoproclamou chefe do Executivo.

"Tudo isso em um momento de profunda divisão política do país, especialmente no governo Bolsonaro, o que acabou dificultando a evolução dessa discussão. Agora, eu creio que [a tradição de governos de esquerda] até perde relevância, ainda que tenhamos oposição de parlamentares claramente comprometidos com a direita mais radical no Congresso. Mas, em geral, acredito que isso não deve impedir a aprovação", adianta Castro.

Com o terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Mercosul voltou a ser um dos focos da política externa do Brasil, que busca retomar o seu protagonismo no bloco. Um dos efeitos dessa mudança já pôde ser visto no Congresso: em setembro, foi criado o grupo parlamentar Brasil-Bolívia, que tem entre os seus objetivos ajudar a sacramentar a entrada do país no grupo. Para o economista Sérgio Duarte de Castro, a aprovação deve ocorrer até, no máximo, o próximo ano.
"Sabemos que o Congresso enfrenta uma série de problemas, ainda segue muito dividido [e] tem várias pautas importantes que estão em discussão neste momento. Então é difícil dizer se o ingresso da Bolívia será aprovado em 2023. Mas, se não este ano, no próximo ano muito provavelmente o acordo deverá ser selado", diz.
Dados do próprio Mercosul apontam que o bloco conta com uma população de quase 300 milhões de pessoas, 50 projetos de cooperação internacional, além de ser a quinta maior economia do mundo.
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'Fatores interferiram negativamente'

O presidente do grupo parlamentar, o senador Chico Rodrigues (PSB-RR), garantiu à Sputnik Brasil que a criação da entidade vai facilitar o processo de discussão, praticamente parado desde 2017.

"Eu, pessoalmente, como presidente do grupo, estou me dedicando bastante junto ao Itamaraty, junto a todo o grupo de senadores que também entendem a importância de a Bolívia entrar no Mercosul. Alguns fatores, que não preciso citá-los, interferiram negativamente [no passado]", argumenta o parlamentar.

Segundo o senador, a entrada da Bolívia é fundamental para aproximar ainda mais as relações econômicas com o Brasil, que inclusive é o seu maior parceiro econômico. Além de compartilharem quase 3,5 mil quilômetros de fronteiras, cerca de 30% do gás natural consumido em território brasileiro vem do país vizinho, que tem quase 12 milhões de habitantes e um PIB de US$ 41,03 bilhões (R$ 208,07 bilhões). "Entendemos que a criação do grupo parlamentar aproxima, através da nossa diplomacia, [os dois países]", conta.

Os quatro países do Mercosul e membros associados contam com uma população de quase 300 milhões de pessoas, 50 projetos de cooperação internacional, além de, juntos, serem a quinta maior economia do mundo.

Cuidado com o efeito 'Venezuela'

Já o analista internacional Vladimir Feijó, professor da Faculdade Arnaldo Janssen, lembrou que também há preocupação do Brasil em não repetir o problema que aconteceu com a Venezuela. Em 2012, a entrada do país no bloco foi sacramentada ainda sob o governo de Hugo Chávez. Porém, pouco tempo depois, a falta de contribuição financeira fez os venezuelanos serem suspensos.
"Uma das causas da reticência do lado brasileiro era a falta de compromisso do governo boliviano com o cumprimento integral de todas as cláusulas do tratado-chave do Mercosul", complementa à Sputnik.
Apesar de ter um mercado pequeno, quando comparado a outros países, o doutor em direito internacional vê uma série de benefícios que a Bolívia pode trazer ao bloco.

"Olhando a média de tarifa externa da Bolívia, ela, de fato, é menor do que a TEC [imposto de importação cobrado pelos países do Mercosul na importação de países de fora do bloco] negociada, mas isso é uma escolha da Bolívia; se ela adere ou não, obrigatoriamente, teria que elevar as suas tarifas ou contribuiria para forçar os países do Mercosul a abaixar as alíquotas", pontua.

Além disso, o especialista vê o país como um grande fornecedor de hidrocarbonetos, a exemplo do gás natural, o que ajuda a contribuir com uma estabilidade dos preços.
"Seria um parceiro ainda mais prioritário para países como Brasil e Argentina e teria uma linha de negociação aberta", enfatiza.
Para a Bolívia, há a possibilidade de participar de um grande bloco de comércio internacional, além de maior comprometimento com a estabilidade política. Perto das eleições, o atual presidente Luis Arce vê o apoio derreter por conta de denúncias de corrupção e problemas na economia. O socialista inclusive deixou de contar com Evo Morales, que deve tentar voltar ao poder.
Presidente da Argentina, Alberto Fernández (à esquerda), desembarcou em São Paulo e foi recebido pelo presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, em 31 de outubro de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 16.11.2022
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Crescimento acima da média da América Latina

Segundo o economista Sérgio Duarte de Castro, antes da pandemia, a Bolívia já se destacava diante de um crescimento anual contínuo do PIB acima de 4,5%, que também levou a uma redução da pobreza para abaixo de 40% pela primeira vez na história.
"Recentemente, ocorreu um rebaixamento nessas previsões em função da crise cambial que ocorre no país, mas mesmo assim ainda é acima da média da América Latina, que deve crescer 1,6% em 2023. O Banco Mundial espera que o país cresça 2,7%, enquanto o FMI [Fundo Monetário Internacional] tem expectativa de 1,8%."
Com relação ao dinamismo econômico que se tornou característico do país nos últimos anos, o especialista prevê que essa marca deve continuar — como exemplo, ele cita a maior reserva de lítio do mundo, mineral estratégico para a produção de veículos elétricos, localizada na Bolívia.

"Essa também é uma questão de interesse para a região e, para o Brasil em particular, é uma oportunidade de investimentos e de participação na exploração [...]. Ainda acabou de lançar um grande programa de política industrial, o que também representa oportunidades de investimentos das empresas brasileiras naquele país", disse.

Por fim, Castro cita um desafio para os próximos anos: o esgotamento das reservas de gás natural, com possibilidade de suspensão das exportações no médio prazo.
"Mas existe um grande potencial de reservas ainda a serem exploradas. E a Petrobras tem tecnologia e possibilidades de contribuir inclusive com essa exploração. O Brasil tem interesse nessa exploração em função da infraestrutura que já está estabelecida com o gasoduto [Brasil-Bolívia]", conclui.
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante sessão Plenária de Chefes e Chefas de Estado do Mercosul, Bolívia, Estados Associados e Convidados Especiais, Buenos Aires, 4 de junho de 2023 - Sputnik Brasil, 1920, 23.09.2023
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