Panorama internacional

Analista: Brasil cobrou países ricos no G20, mas adesão ao Sul Global pode causar 'guerra econômica'

O Brasil reivindicou no G20 a ajuda que os países mais ricos se comprometeram a dar. A participação do país no encontro foi avaliada como boa por especialistas. Porém um deles destacou que as falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva "não foram das melhores" e que há "endurecimento" em relação à postura comercial da União Europeia (UE).
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Na visão de Alexandre Pires, professor de relações internacionais do Ibmec, o G20 é um fórum de "discussão internacional, não um espaço para tomada de decisões".

"Não é exatamente nas reuniões que o Brasil vai se destacar, mas naquilo que ele vai propor como agenda para o próximo ano. Todo o preparatório que vai ser feito para fazer o encontro no Brasil causar certo impacto", ressaltou, em entrevista à jornalista Melina Saad, da Sputnik Brasil.

Para ele, o Brasil fez bons encontros com países relevantes, como França, Turquia, Egito e Japão.
No entanto, prosseguiu, são inícios de tratativas e nada concreto foi determinado. "Por enquanto, o que paira sobre o Brasil é o acordo entre Mercosul e União Europeia, e esse ainda não teve seus nós desatados", pontuou.
Ainda sobre essa questão, Pires disse que o presidente Lula tem feito uma pressão sobre o bloco europeu, constrição que já acontecia no governo Bolsonaro, mas que ainda é classificada como "fraca".
Pires notou que a UE tem jogado especialmente com seus sócios, como a França, que não têm muito interesse em relação a algumas pautas ambientais.
O intuito seria dificultar o acordo que abriria para o Brasil o mercado agrícola, agrário e agroindustrial da UE, que é extremamente competitivo.
"Então há uma certa má vontade, justificada do ponto de vista estratégico. A retórica [do Brasil] tem buscado quebrar isso e achar algum caminho e solução."
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Por outro lado, um exemplo de bom resultado dos encontros bilaterais do G20 para o Brasil foi, segundo o analista, o acerto da vinda do presidente da França, Emmanuel Macron, ao Brasil, em 2024, justamente para negociar o acordo UE-Mercosul.
Só que o governo brasileiro tem ameaçado sair da negociação e trazer tudo para a estaca zero. "Talvez isso sensibilize alguns sócios europeus que queiram melhorar a sua insegurança, para estreitarem os laços com o Brasil", ponderou. "É preciso chegar a um acordo, ou fazer um acordo, ou discutir o acordo. Porque após 22 anos de discussão, ninguém acredita mais", afirmou.
Ainda de acordo com o professor, o quadro de conflitos bélicos e de insegurança alimentar em vários países tem feito com que o acordo não avance.
Pires enxergou nas declarações do presidente Lula no G20 a sinalização de um "alinhamento" com os pleitos de China e Rússia.
Em sua visão, isso pode fazer com que o Brasil sofra retaliações no campo diplomático com relação à "má vontade em termos de cooperação econômica, tecnológica e científica".

"Mas isso também pode evoluir em um cenário de guerra econômica, em que o Brasil acabe parado na linha de tiro das grandes potências mundiais."

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Brasil assumiu suas prioridades externas

A participação brasileira no G20, no geral, foi boa, na avaliação de Leonardo Paz, professor de relações internacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV), feita à Sputnik Brasil. Isso porque o Brasil marcou posicionamentos em relação à diplomacia e em relação aos acordos bilaterais na economia.
Segundo ele, um dos mais significantes foi o acordo entre o Mercosul e a UE, fazendo sentido o presidente Lula avançar nessa questão.

"O acordo já estava fechado com a União Europeia quando veio uma carta adicional com maus compromissos para o Mercosul. Não só compromissos, mas também instrumentos que obrigam mais demandas para o lado do Mercosul. A União Europeia, por sua vez, não está dando contrapartida em relação a isso, então nada mais natural do que ele [Lula] criticar e se posicionar contra isso. Aceitar um acordo da forma como está é uma capitulação ao acordo. O impasse é que a UE quer manter os compromissos, novos compromissos da carta. Já Lula e Mercosul não têm nenhum interesse em manter esse novo compromisso."

O professor ainda levantou outro ponto de discordância, sobretudo em relação a concessões feitas pela gestão anterior, do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Paz acredita que a negociação deve continuar estagnada, já que ambas as partes terão que ceder.

"Eu diria que o Lula também tem uma crítica com relação ao que já está no acordo aceito pelo governo Bolsonaro, quanto à questão das compras governamentais e à abertura do setor de compras governamentais pelas empresas europeias. Para o atual governo, isso não poderia ter sido feito, porque vai prejudicar fortemente as empresas brasileiras, que têm o governo como o seu principal cliente", conclui.

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