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O que esperar da atuação de André Mendonça, novo ministro do STF?

O Senado Federal aprovou a indicação de André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta-feira (1º), para ocupar a vaga do ex-ministro Marco Aurélio Mello.
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A votação, apertada para uma indicação ao tribunal (47 a 32), revelou que há dúvidas dos parlamentares quanto à imparcialidade do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública e ex-advogado-geral da União (AGU).
Evangélico e próximo ao presidente Jair Bolsonaro (PL), Mendonça demonstrou ter um perfil conservador em sua trajetória. Porém, na sabatina do Senado, nesta quarta-feira (1º), o novo ministro procurou passar a imagem de que defenderá a Constituição quando tomar posse, no próximo dia 16.
No início de seu mandato, Bolsonaro havia prometido indicar um ministro "terrivelmente evangélico" ao STF. Após a aprovação no Senado, Mendonça classificou sua indicação como "um passo para os homens e um salto para os evangélicos".
Antonio Carlos de Freitas Júnior, doutor em Direito Constitucional e Eleitoral pela Universidade de São Paulo (USP), acredita que Mendonça poderá fazer eventuais ajustes em suas futuras decisões na corte, mas que não deverá alterar sua linha de pensamento a ponto de não ser considerado conservador.
Para o especialista, a postura do novo ministro na sabatina foi muito mais pragmática para garantir a aprovação do que um indicativo de mudança de rota.

"Acredito que, sobretudo, na pauta de costumes ele vai ter, sim, uma tendência conservadora. E em questões políticas e estratégias, me parece que também haverá uma certa fidelidade à estrutura ideológica do governo Bolsonaro, embora também acredite que tudo seja feito com base na Constituição", afirmou Freitas, em entrevista à Sputnik Brasil.

André Mendonça gesticula diante da Comissão de Constituição e Justiça do Senado durante sabatina de sua indicação ao Supremo Tribunal Federal (STF), em 1º de dezembro de 2021.
André Mendonça é o segundo ministro indicado por Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF), desde que assumiu a presidência da República. O primeiro foi o ministro Kassio Nunes Marques, também com tendência ideológica próxima à do governo.

Diferenças para o antecessor

Seu antecessor na corte, Marco Aurélio Mello deixou o posto em 12 de julho, após 31 anos. Mendonça foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro no dia seguinte, mas sua votação ficou "congelada" no Senado devido a atritos do governo com os demais poderes, em meio à CPI da Covid.

"Ele era um ministro muito antigo, conhecido por ser, em regra, minoritário, sempre com posicionamentos extravagantes, excepcionais, porém, sempre com base constitucional, obviamente", lembrou Freitas.

O ministro Marco Aurélio Mello em sessão no plenário do STF (Supremo Tribunal Federal).
Para o professor, os dois têm perfis bem diferentes. Enquanto Marco Aurélio era visto como um ministro "garantista", que buscava assegurar o direito de acusados, o novo ministro é mais alinhado com o "lavajatismo".
"Há muita diferença no sentido dessa pauta mais conservadora, dessa interpretação dos valores constitucionais, mais ligados a valores tradicionais da sociedade. Então, vemos, sim, que vai ter uma diferença do Marco Aurélio, sobretudo nessa pauta dos costumes, trazendo esse composto tradicional da sociedade", apontou.

'Lavajatismo' x 'garantismo'

Apesar do perfil de Mendonça, Freitas acredita ser importante aguardar as decisões do futuro ministro na corte antes de classificá-lo como "lavajatista raiz".
"Não dá para saber. Ele tem essa tradição 'lavajatista', de uma interpretação mais arrojada do texto constitucional, permitindo certa criatividade dos juízes em torno do combate à corrupção, que se opõe ao 'garantismo'. Mas isso realmente vamos esperar para ver", ponderou.
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Segundo o professor, o novo ministro tem um passado "eminentemente a favor da interpretação criativa da Lava Jato" e a recente defesa do garantismo penal ainda precisa, de fato, ser verificada na prática.
"Acho que teremos alguns momentos 'lavajatistas' e algum tipo de 'garantismo'. Mas 'garantismo' ao pé da letra não veremos", previu o especialista.

Estado laico

De acordo com o especialista, todo ministro do Supremo carrega suas visões de mundo ao chegar à corte. Apesar de o Estado ser laico, Freitas aponta que a visão religiosa de Mendonça deverá ter impacto em suas decisões.
"Precisamos ser realistas. O ministro, ao julgar, ao dar uma interpretação à Constituição, carrega consigo valores morais, filosóficos e religiosos. Então, sim, teremos influência da religião, porque ela influencia o pensamento, a visão do mundo desse ministro. Ele é um pastor evangélico, ele tem esses valores religiosos muito bem sedimentados na visão de mundo, que vão, obviamente, influenciar suas decisões no STF", afirmou.

Reação de outros ministros da corte

Sobre futuras votações no plenário do Supremo, Freitas acredita que o Brasil deverá testemunhar debates "minimamente acalorados", com visões de mundo distintas. Segundo ele, há muitos ministros do STF que se declaram "progressistas" e outros "iluministas".
"Acho que isso é bom. É bom levar visões diferentes para a discussão, havendo diálogo sadio, havendo de todas as partes a questão civilizatória, e tendo sempre como norte a Constituição, acho que é válido esse debate. É válida essa diversidade, que agora a nossa corte constitucional passa a ter", afirmou.
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O professor ainda comentou até que ponto questões de alto grau de interesse do presidente Bolsonaro podem influenciar a atuação de Mendonça.

"Já houve ministro que deixou de votar, que declarou 'impedimento', 'suspeição', em razão de algum tipo de possível desconforto no teor das votações. Vamos ver se esse desconforto será enfrentado pelo ministro de maneira a se declarar 'suspeito', 'impedido', ou se avançará em temas diretamente de interesse do presidente da República", disse.

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