Reorganização do sistema global marca ano 'emblemático' para o BRICS, diz pesquisador

© AP Photo / Eraldo PeresPresidentes da China, Xi Jinping (à esquerda), e da Rússia, Vladimir Putin, durante encontro do BRICS no Itamaraty. Brasília, Brasil, 14 de novembro de 2019 (foto de arquivo)
Presidentes da China, Xi Jinping (à esquerda), e da Rússia, Vladimir Putin, durante encontro do BRICS no Itamaraty. Brasília, Brasil, 14 de novembro de 2019 (foto de arquivo) - Sputnik Brasil, 1920, 26.12.2022
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Em 2022, o BRICS voltou a ter papel de destaque, atraindo o interesse de diversos países na adesão. Para discutir o assunto, a Sputnik Brasil ouviu um economista e um pesquisador de relações internacionais, que avaliaram a possibilidade de expansão e a expectativa sobre o papel do grupo em 2023 em meio ao rearranjo do poder global.
Argélia, Argentina, Arábia Saudita e Egito foram alguns dos países que demonstraram interesse em aderir ao BRICS ao longo deste ano, fortalecendo uma tendência de apoio à multipolaridade defendida pelos países-membros do agrupamento. O crescimento do interesse pelo grupo de países em desenvolvimento, que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, se dá em um contexto de mudanças radicais do cenário geopolítico global.
Para o economista Walter Franco, professor de economia do Ibmec, o ano de 2022 foi positivo para o BRICS, levando-se em conta as dificuldades econômicas que continuam afetando o mundo desde o início da pandemia de COVID-19.

"Algumas economias se saíram melhor, outras pior, mas não creio que tenha tido nenhum tipo de abalo à instituição em si", avalia o pesquisador em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, acrescentando que a economia brasileira deve se destacar no grupo em 2023.

Segundo o professor, o BRICS representa "uma sinergia de economias em desenvolvimento" em busca não apenas de avanços econômicos e sustentáveis de longo prazo, mas também "uma alternativa à ordem econômica mundial" estabelecida no fim da Segunda Guerra Mundial.
Na opinião do pesquisador, uma possível expansão do grupo precisa ser avaliada caso a caso.
© AP Photo / Themba HadebeMulher passa diante de cartaz em homenagem ao ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela durante encontro do BRICS em Joanesburgo, na África do Sul, em 27 de julho de 2018
Mulher passa diante de cartaz em homenagem ao ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela durante encontro do BRICS em Joanesburgo, na África do Sul, em 27 de julho de 2018 - Sputnik Brasil, 1920, 25.12.2022
Mulher passa diante de cartaz em homenagem ao ex-presidente da África do Sul Nelson Mandela durante encontro do BRICS em Joanesburgo, na África do Sul, em 27 de julho de 2018
O economista acredita que o Brasil figura hoje como uma economia "responsável" e se apresenta "como um parceiro determinante para que esse grupo seja respeitado" e visto como uma "alternativa à ordem econômica mundial pós-1944".

"O mais importante que tudo é olharmos sempre para essa associação como algo que vem cooperar e vem agregar com o desenvolvimento econômico dos países-membros. De maneira alguma ela vem como uma rivalidade ou para [se] opor ao que já existe hoje no mundo. As instituições precisam conversar e cooperar entre si", afirma.

Na visão de Franco, a área da defesa também pode oferecer oportunidades de investimento e cooperação no âmbito do BRICS, desde que para fins pacíficos. Apesar disso, ele ressalta que há diferenças marcantes nessa área entre os países do grupo.

"Os BRICS hoje, como nós conhecemos e pela sua diversidade, pelas características das suas nações, são muito peculiares, e os investimentos em defesa também são. As prioridades são muito diferentes, dos pontos de vista de defesa e de investimento em defesa, em um país como o Brasil e em um país como a Rússia, como a Índia, por exemplo", aponta.

© AP Photo / Wu HongBandeiras dos países-membros do BRICS durante encontro de cúpula na China, em 4 de setembro de 2017
Bandeiras dos países-membros do BRICS durante encontro de cúpula na China, em 4 de setembro de 2017 - Sputnik Brasil, 1920, 25.12.2022
Bandeiras dos países-membros do BRICS durante encontro de cúpula na China, em 4 de setembro de 2017

'Reorganização do sistema' global marca ano emblemático para o BRICS

Também em entrevista ao Mundioka, Boris Zabolotsky, doutorando em ciência política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), destaca que o ano de 2022 foi "emblemático" para o BRICS. Segundo Zabolotsky, que é pesquisador visitante no programa Inter-Rússia do Fundo Gorchakov, em parceria com o Instituto Estatal de Relações Internacionais de Moscou, este foi um ano de "reorganização do sistema que emergiu no pós-Guerra Fria".
Na avaliação do analista, Rússia, Índia e China são o centro gravitacional das "reivindicações para um rearranjo dessa ordem", sendo que Moscou se destaca nesse âmbito, uma vez que "é impossível tratar de questões de segurança na Europa sem levar em consideração a posição russa".

"A Rússia se destaca porque, apesar de todas as sanções e dos embargos que vêm sendo perpetrados, quem está pagando a conta maior em termos econômicos, sobretudo, é a própria União Europeia. Isso manda um recado bastante emblemático, bastante importante, porque se mostra que aquela ordem específica não é insubstituível [...], uma vez que a Rússia está conseguindo superar todo o conjunto de sanções que vêm sendo impostas a ela", afirma o pesquisador.

© Sputnik / Sergei Guneev Vladimir Putin e Xi Jinping antes da foto conjunta dos líderes dos países-membros da Organização para Cooperação de Xangai (SCO, na sigla em inglês), em 16 de setembro de 2022
Presidente russo, Vladimir Putin, e o líder chinês, Xi Jinping, antes da foto conjunta dos líderes dos países-membros da Organização para Cooperação de Xangai (SCO, na sigla em inglês), em 16 de setembro de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 25.12.2022
Vladimir Putin e Xi Jinping antes da foto conjunta dos líderes dos países-membros da Organização para Cooperação de Xangai (SCO, na sigla em inglês), em 16 de setembro de 2022
Para Zabolotsky, o BRICS "sempre teve um papel importante" no mundo devido às características de seus países-membros, mas, ao longo deste ano, foi possível notar um destaque crescente do grupo novamente.

"Acredito que a partir deste ano, 2022, o que a gente viu foi um retorno maior. Há uma agenda multilateral dentro dos membros. Acredito que é nesse sentido que o BRICS assume o maior destaque, porque o que se observou foi uma grande sinergia no bloco em relação, por exemplo, às votações na ONU [Organização das Nações Unidas] e ao conflito na Ucrânia", afirmou.

Na avaliação do pesquisador, esses elementos mostram "certa coesão interna" entre os países do BRICS que não era "tão visível até então". Para ele, isso simboliza que 2022 consolida uma tendência de superação da ordem econômica mundial no grupo.
© AP Photo / Manish SwarupVladimir Putin e Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia, apertam as mãos durante encontro em Nova Deli, na Índia, em 6 de dezembro de 2021
Vladimir Putin, presidente da Rússia (à esquerda), e Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia, apertam as mãos durante encontro em Nova Deli, na Índia, em 6 de dezembro de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 25.12.2022
Vladimir Putin e Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia, apertam as mãos durante encontro em Nova Deli, na Índia, em 6 de dezembro de 2021

"Acredito que 2022 seria a consolidação dessa tendência, porque essa tendência já vem se delineando há um bom tempo. Desde pelo menos o fim dos anos 1990, início dos anos 2000, porque os países do BRICS já se alinhavam em torno de um discurso de defesa da multipolaridade", aponta, acrescentando que esse processo é impulsionado pelos resultados do Consenso de Washington, pela globalização desigual e pela recente ascensão da China.

Nesse sentido, Zabolotsky acredita que o redirecionamento das exportações de gás da Rússia para a China em 2023, como consequência das sanções europeias contra Moscou, deve impulsionar ainda mais a expansão chinesa. O pesquisador lembra que Pequim também deve ocupar o espaço deixado na Rússia pela saída de empresas ocidentais. "Essas questões vão ser catalisadoras do desenvolvimento chinês no futuro", afirma.
© FolhapressPresidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva concede coletiva de imprensa para finalizar os trabalhos da equipe de transição. Brasília, Brasil, 13 de dezembro de 2022
Presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva concede coletiva de imprensa para finalizar os trabalhos da equipe de transição, em Brasília (DF), em 13 de dezembro de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 25.12.2022
Presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva concede coletiva de imprensa para finalizar os trabalhos da equipe de transição. Brasília, Brasil, 13 de dezembro de 2022
Apesar de uma postura recente que via o BRICS como uma plataforma de comércio bilateral, o Brasil, afirma o pesquisador, redirecionou sua abordagem sobre o agrupamento em meio aos desdobramentos do conflito ucraniano.

"Parece que houve um retorno do reconhecimento da importância do BRICS na política externa brasileira. [...] Acredito que houve um certo hiato de alguns anos e agora novamente tem um retorno. E ao que tudo indica, no próximo governo, do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, haverá novamente um incremento das relações dentro do BRICS, uma vez que o próprio presidente Lula foi um dos fundadores e grandes entusiastas da ideia", afirma.

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