Panorama internacional

Resgatar a Venezuela após fracasso das sanções dos EUA favorece o Brasil, diz analista

Presidente Lula aposta na reintegração da Venezuela ao cenário regional, apesar da forte oposição de países como Chile, Uruguai e Paraguai. A Sputnik Brasil conversou com especialista para saber qual o melhor caminho para retomar as relações com Caracas e o que o Brasil tem a ganhar com isso.
Sputnik
O início da presidência brasileira no Mercosul coloca a volta da Venezuela ao bloco no topo da agenda. Ao assumir o cargo temporário, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu que "problemas de democracia" no país fossem encarados pelos parceiros do bloco.

"Com relação à questão da Venezuela, gente, todos os problemas que a gente tiver de democracia, a gente não se esconde deles, a gente enfrenta", disse Lula durante a Cúpula de Líderes do Mercosul.

Assim como Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, a Venezuela é membro pleno do Mercosul. No entanto, o país foi suspenso do bloco em 2017, por não atender às cláusulas democráticas impostas pelo Protocolo de Ushuaia.
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante sessão Plenária de Chefes e Chefas de Estado do Mercosul, Bolívia, Estados Associados e Convidados Especiais, Buenos Aires, 4 de junho de 2023
Desde então, a Venezuela foi alvo de política ativa de isolamento, que buscava impedir a participação de Caracas em foros regionais. Além disso, o país é alvo de sanções econômicas impostas unilateralmente pelos Estados Unidos, que impedem a sua participação plena no comércio internacional.
De acordo com o professor de História da América da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Rafael Pinheiro de Araújo, o presidente Lula acerta ao buscar reintegrar Caracas às relações internacionais.
"O isolamento e o embargo econômico não contribuíram em nada para a solução da crise venezuelana, pelo contrário geraram mais de 7,2 milhões de emigrantes, 6,2 milhões dos quais se encontram espalhados pela América Latina", disse Araújo à Sputnik Brasil. "Está provado que as sanções só prolongam a crise e punem os mais humildes."
Além disso, a imposição do embargo econômico por parte dos EUA e aliados contra a Venezuela "legitimou o discurso anti-imperialista do governo de Maduro e deu carta branca para medidas eleitorais contestadas".
Ashley Angelina, de 9 anos, segura sua boneca enquanto pedia carona com seu irmão gêmeo, Angel David, e seus pais, após cruzarem a fronteira com a Venezuela em sua migração para o Brasil, perto de Pacaraima, Roraima, Brasil (foto de arquivo)
"Resgatar a Venezuela é o correto a ser feito, apesar de que o Brasil ainda não parece ter encontrado a forma ideal de lidar com essa questão", considerou Araújo.

Por onde começar?

Os ganhos econômicos da reintegração venezuelana esbarram em obstáculos políticos, impostos por diversos governos do continente americano. Durante a reunião do Mercosul, Uruguai e Paraguai não se mostraram dispostos a dialogar com o governo Maduro.
A Argentina, aliada de Lula nessa empreitada, pode mudar de lado após as eleições presidenciais, previstas para outubro de 2023.
"Independentemente do que acontecer com a Argentina, já sabemos que Uruguai e Paraguai vão impor resistência", disse Araújo. "A volta da Venezuela para o Mercosul exigirá negociações difíceis."
O especialista ainda nota que a oposição a Maduro não é monopólio de governos de direita, uma vez que o presidente esquerdista do Chile, Gabriel Boric, também é contra o diálogo com Caracas.
O presidente do Chile, Gabriel Boric, do lado de fora de assembleia de voto, durante entrevista coletiva após votar o plebiscito sobre um novo projeto de Constituição do país, em Punta Arenas, em 4 de setembro de 2022
Nesse sentido, o canal mais favorável para a normalização das relações diplomáticas com a Venezuela é o bilateral. Brasil e Venezuela já retomaram sua agenda, como demonstrado durante a visita de Maduro a Brasília em maio deste ano.
Na ocasião, o Brasil considerou a renegociação da dívida venezuelana, estimada em US$ 1 bilhão pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, conforme reportou o jornal O Globo.
Apesar da retomada econômica venezuelana ainda ser tímida, o retorno de Caracas ao Mercosul garantiria a abertura de importante mercado para o Brasil, além de acesso a recursos energéticos relevantes.
"A Venezuela é a Arábia Saudita das Américas. Então mesmo em crise, é um parceiro interessante não só para o Brasil, mas para a América Latina como um todo", concluiu Araújo.
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