Panorama internacional

Xeque-mate: discurso de Putin marca fim do jogo para apoiadores dos EUA e da OTAN, diz analista

O presidente russo Vladimir Putin anunciou a mobilização parcial em 21 de setembro e prometeu defender o direito das regiões de Donbass, Kherson e Zaporozhie de realizar referendos sobre a adesão à Rússia.
Sputnik
"Uma vez que as regiões de Lugansk e Donetsk, Zaporozhie e Kherson estiverem integradas na Federação da Rússia, o jogo acaba", disse Paolo Raffone, diretor da fundação CIPI, um think tank geopolítico com sede em Bruxelas.
"Na verdade, o presidente dos EUA disse repetidamente que seu país não está em guerra com a Rússia e que não quer enviar tropas americanas para o terreno a fim de combater a Rússia, nem quer usar armas não convencionais. Devido aos problemas domésticos nos EUA, será difícil reverter essa abordagem pelo menos até as eleições presidenciais de 2024."
Os referendos sobre a adesão à Rússia serão realizados nas quatro regiões do leste da Ucrânia nos dias 23 e 27 de setembro. No discurso de quarta-feira (21) à nação, Putin chamou a atenção para "a política de intimidação, terror e violência" perseguida por Kiev contra os residentes de Donbass e ucranianos que têm opiniões pró-russas. Esta política tornou-se "mais massiva, terrível e bárbara", ressaltou o presidente.
A região de Donbass está sob os ataques de Kiev desde 2014, quando um golpe de Estado apoiado pelos EUA viu o presidente democraticamente eleito, Victor Yanukovich, deposto por grupos paramilitares neonazistas.
Em abril de 2014, as autoridades ucranianas lançaram uma operação "antiterrorista" contra a população pró-russa do leste da Ucrânia. Independentemente dos esforços do Quarteto da Normandia, Kiev rejeitou os acordos para a reconciliação com suas repúblicas separatistas, os chamados Acordos de Minsk.
Enquanto isso, figuras da oposição da Ucrânia, jornalistas, políticos e até mesmo crianças que expressam opiniões contradizendo a agenda de Kiev têm sido frequentemente colocadas na lista de "inimigos da Ucrânia" pelo famoso site Mirotvorets, com alguns terminando mortos. Após o início da operação especial russa em 24 de fevereiro, forças militares ucranianas e batalhões neonazistas intensificaram os expurgos contra ucranianos pró-russos, bem como a tortura e assassinato de prisioneiros de guerra russos.

"Sabemos que a maioria das pessoas que vivem nos territórios libertados, e estas são principalmente as terras históricas de Novorossiya, não querem viver sob o jugo do regime neonazista. A Rússia não pode deixar que aqueles que lhe são próximos sejam massacrados por carrascos e não responder às suas aspirações de determinar o seu próprio destino", disse Putin.

Putin ainda ressaltou que Washington, Londres e Bruxelas estão abertamente encorajando Kiev a mover as hostilidades para o território russo e até mesmo recorrer à chantagem nuclear. O presidente destacou que a Rússia protegerá sua integridade territorial e soberania "por todos os sistemas que temos disponíveis", acrescentando que Moscou possui diferentes tipos de armas, algumas das quais são mais modernas do que as armas da OTAN.
O discurso de Putin foi recebido com a "histeria formalista do Ocidente", segundo Raffone. O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, e o embaixador dos EUA em Kiev afirmaram que a mobilização parcial da Rússia e os referendos são "sinais de fraqueza". O ministro alemão da Economia, Robert Habeck, disse que o desenvolvimento é "ruim e errado", enquanto o secretário britânico da Defesa, Ben Wallace, declarou que o discurso de Putin indica que a Ucrânia está "ganhando".
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Por sua vez, o primeiro-ministro polonês Mateusz Morawiecki disse que Varsóvia "não pode concordar" com a decisão russa. Qualquer que tenha sido a forma como os líderes ocidentais reagiram ao discurso de Putin, agora está claro que qualquer atividade militar contra as regiões em questão significará automaticamente uma "guerra contra a Rússia", segundo Raffone. "Este é um forte impedimento que já funcionou no caso da Crimeia", argumentou o diretor do think tank. "Se os EUA ou alguns Estados da UE não entenderem este ponto, a escalada da guerra é uma certeza."

"O referendo é uma consequência lógica do confronto atual", disse Tibério Graziani, presidente da Vision & Global Trends, um think tank de assuntos internacionais com sede na Itália. "Faz parte da construção da zona de segurança da Federação da Russa. Além disso, garante a participação das populações ali residentes na vida política e civil, comprometidas pelo menos desde 2008."

Ao mesmo tempo, o impasse é muito mais amplo do que um conflito russo-ucraniano, de acordo com Raffone. A crise decorre da intenção de Washington de evitar o declínio de seu domínio global, explicou o estudioso. O diretor do think tank observa que, neste esquema, a Ucrânia tem sido usada pelos EUA como um "cavalo de Tróia" contra a UE e a Rússia. "Desde 2001, o resto do mundo começou a trabalhar em uma nova ordem mundial que visava relativizar o domínio dos EUA", argumentou Raffone.
"A Europa é uma obra-prima do domínio dos EUA que não pode ser deixada acessível aos 'outros' e não deve ter autonomia estratégica. Para isso, os EUA têm constantemente pressionado a Alemanha, que ousou desafiar os EUA com vários acordos (não apenas no setor energético) com a Rússia e acordos comerciais com a China. Os planos para desestabilizar a Alemanha e a UE começaram em 2004-2008 e avançaram desde 2014, usando a Ucrânia como um cavalo de Tróia contra a UE e a Rússia."
Enquanto isso, a decisão de mobilização parcial anunciada por Putin vai ter um efeito estabilizador sobre o conflito, impedindo-o de uma nova escalada, segundo Raffone.
"Além disso, o envio de tropas russas adicionais para as regiões de Lugansk, Donetsk, Zaporozhye e Kherson cria as condições de segurança para que o referendo ocorra", ressaltou o diretor do think tank.
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