Panorama internacional

Pandemia brasileira? Micróbios descobertos em geleiras do Tibete ligam alerta para Amazônia

O descongelamento de geleiras, assim como o desmatamento de florestas e a destruição de outros ecossistemas, pode levar ao surgimento de novas pandemias, segundo cientistas. Para entender os riscos para o Brasil, a Sputnik Brasil conversou com a epidemiologista Ethel Maciel.
Sputnik
Em amostras coletadas nas geleiras do Tibete, pesquisadores da Academia Chinesa de Ciências Sociais (CASS, na sigla em inglês) encontraram quase mil espécies de micróbios que apresentam o potencial de propagar doenças. A descoberta foi publicada em 27 de junho na revista Nature Biotechnology.
Conforme noticiou a revista Galileu, as coletas de neve e gelo ocorreram em 21 geleiras do planalto Tibetano, entre os anos de 2010 e 2016. Ao analisarem as amostras, os cientistas detectaram algas, bactérias e fungos de várias espécies.
"Apesar de condições ambientais extremas, como baixas temperaturas, altos níveis de radiação solar, ciclos periódicos de congelamento e degelo e limitação de nutrientes, as superfícies das geleiras suportam uma gama diversificada de vida", afirmaram os autores do estudo. Dos organismos encontrados, 98% das espécies eram desconhecidas pela ciência.
Geleiras da Groenlândia. Foto de arquivo
Recentemente, cientistas apontaram que, como um dos campeões de desmatamento e de fragmentação de florestas e outros ecossistemas, o Brasil poderia ser palco de origem de novas zoonoses.
Há riscos reais de algo como uma pandemia brasileira ocorrer? Como o país deve se prevenir de um cenário como esse? O Brasil pode ser impactado pela eventual disseminação dos organismos recém-descobertos no Tibete, assim como ocorreu com o vírus da COVID-19?
Para a epidemiologista Ethel Maciel, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), o mundo sempre estará em risco de ter novas pandemias. Segunda ela, os micro-organismos, incluindo os vírus e bactérias, estão em constante mutação, até mesmo aqueles que existem apenas em florestas ou em animais e aqueles que o ser humano ainda desconhece.

"Principalmente pela maneira como nós tratamos o meio ambiente, predatória, acabamos entrando em contato com os organismos. Essa descoberta [no Tibete] tem relação com as geleiras, com o descongelamento das geleiras. Não temos defesa contra esses micro-organismos. Certamente é um risco", alertou.

De acordo com a epidemiologista, os vírus não fazem uma adaptação tão rápida. A varíola dos macacos, uma zoonose, por exemplo, passou anos tendo sua transmissão concentrada em países africanos, de animal para humanos, explicou.

"O vírus demorou por volta de 40 anos em mutações aqui e ali, passando desapercebido, e agora consegue fazer mudanças, consegue se adaptar à espécie humana, causando com muito mais facilidade a transmissão, inclusive de humano para humano. Vírus de RNA têm uma capacidade muito grande de fazer mutações", afirmou Maciel.

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Riscos na Amazônia

Para a especialista, não se pode descartar a possibilidade de pandemias ou epidemias surgirem a partir da floresta Amazônica brasileira. Ela indica que, para prevenir algo dessa magnitude, é preciso haver "uma vigilância epidemiológica mais consolidada e elaborada".

"Temos que fazer vigilância genômica. Temos chamado bastante a atenção para a 'saúde única' de humanos, animais e meio ambiente. Tudo faz parte do mesmo ecossistema. Com desequilíbrio em um, há a possibilidade de a doença ser transmitida para outro. Então existe uma interdependência", apontou.

Amazônia (imagem de referência). Foto de arquivo
Por isso Maciel ressalta a importância de "investimentos em ciência, em laboratórios equipados com condições de realizar diagnósticos por meio de biologia molecular de sequenciamento genético".
Ela diz que atualmente há poucos locais no Brasil que fazem esse trabalho e o investimento é baixo. A especialista conta que no meio acadêmico científico se discute cada vez mais a necessidade de os países se prepararem para outras pandemias, criando centros de emergência em saúde pública como os de meteorologia.
Esses centros, segundo ela, indicariam rapidamente novas detecções e seus potenciais, ajudando ainda a organizar uma rede de atenção para orientar a população com informações sobre riscos e exames a serem realizados.

"Tudo são orientações que precisam estar muito estabelecidas. Infelizmente neste governo temos um desmonte do nosso Sistema Único de Saúde [SUS]. Precisamos pensar em como fortalecer o SUS com novas estruturas que possam responder a essas emergências de saúde pública", afirmou.

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