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Pavimentando a 3ª via: voto útil pode minar as chances de emplacar essa força política?

Na última quinta-feira (14), o União Brasil, partido que congrega PSL e DEM desde o fim do ano passado, anunciou sua escolha de pré-candidato à Presidência da República. Trata-se de Luciano Bivar, que comanda a sigla nacionalmente.
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Nome sequer cogitado nas pesquisas de intenção de voto até então, Bivar pôs uma pá de cal nos sonhos do ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sergio Moro — que, em um movimento inesperado, deixou o Podemos, partido ao qual se filiara para concorrer ao Planalto, e ingressou no União Brasil.
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Moro, no entanto, não sinalizou que jogou a toalha na seara da disputa pelo trono da terceira via.
Mesmo tendo sido descartado pelo União Brasil anteriormente — a ala do DEM chegou a pedir a impugnação de sua filiação —, a postura de Moro é de que ainda não saiu do jogo presidencial, como disse anteriormente, e de que continua "como um soldado da democracia", sem deixar claro, contudo, para o que vai se candidatar.
A aliados nos bastidores, o ex-juiz diz que não vai se candidatar a deputado federal por São Paulo conforme a vontade de seu partido, segundo informou o jornal O Estado de S. Paulo nesta segunda-feira (18).
Tanto as ambições de Moro quanto a pré-candidatura de Bivar tornam ainda mais árdua a pavimentação de um caminho para a terceira via, cuja premissa se baseia em "nem Lula, nem Bolsonaro", em uma corrente ideológica estabelecida na centro-direita.
Além dos dois, João Doria (PSDB) e Simone Tebet (MDB) também despontam como nomes para uma possível coalizão partidária entre as três siglas e o Cidadania.
A senadora Simone Tebet (MDB) em seu gabinete em Brasília no dia 9 de dezembro de 2021.
Um nome único e consensual entre os quatro está previsto para ser anunciado em 18 de maio, ou seja, daqui a exatamente um mês.

Seara indefinida

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Para Marcus Ianoni, professor associado do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), o prognóstico entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que é líder em todos os cenários nas pesquisas eleitorais para a Presidência da República, e Jair Bolsonaro (PL), que almeja a reeleição, segue sendo o cenário de disputa mais provável.

"A política é dinâmica e prever o processo político é arriscado. No entanto, considerando as tendências em curso, creio que, a esta altura da conjuntura política e, em particular, da conjuntura eleitoral, dificilmente será revertida a liderança de Lula e Bolsonaro no primeiro turno. Hoje o espectro da terceira via está embutido na candidatura de Lula. As pesquisas mostram que quase metade dos eleitores de centro vão votar em Lula, assim como 70% dos eleitores de esquerda", observa ele.

De olho nessa questão, caciques do MDB tentam fazer com que Tebet desista da candidatura — é o caso do trio de senadores Renan Calheiros (AL), José Sarney (MA) e Eunício Oliveira (CE), que defendem um apoio a Lula nas eleições.
Da esquerda para a direita, o senador Renan Calheiros e os ex-senadores Romero Jucá (ao fundo), Eunício Oliveira e José Sarney após café da manhã com o ex-presidente Lula, em 15 de fevereiro de 2015.
Se lançada de fato, a terceira via pode engolir parte dos votos dos dois principais nomes da disputa à Presidência. "Resta saber o quanto a candidatura a ser apresentada como representando a terceira via vai implicar em perda de apoio para Lula e para Bolsonaro", afirma Ianoni.
O cientista político aponta que, por um lado, a união em torno de um nome de terceira via pode aumentar um pouco sua base de apoio e seus recursos políticos, tempo de TV, entre outros fatores.

"Por outro lado, dado o caráter personalista da eleição presidencial, não se constrói uma candidatura apenas com esses recursos, pois, em última instância, quem decide o voto é o eleitor. Considerando que esse candidato da terceira via não vai cair do céu, pelo contrário, é um nome conhecido, imagino que se esse nome tivesse efetiva viabilidade para alterar a disputa entre Lula e Bolsonaro, ele já estaria relativamente bem posicionado", estima.

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Ele lembra, porém, que nenhum nome, à exceção de Lula e Bolsonaro, alcançou dois dígitos até agora — e é muito difícil que isso mude.
"A saída de Moro implicou em migração de votos para Bolsonaro, pois Moro era bolsonarista até pouco tempo atrás", lembra Ianoni.
As alianças que Lula vem fazendo, incluindo as tentativas de composição com os cardeais do MDB e do centrão, também devem causar algum efeito nos resultados das eleições presidenciais de 2022.
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A formação de chapa com o vice-candidato à Presidência Geraldo Alckmin (PSB), nome mais palatável para segmentos do centro e da direita moderada, é um desses movimentos para atrair uma parcela de eleitores além dos da tradicional esquerda brasileira.

"Por outro lado, o fato de Lula ter feito coalizão com Alckmin o torna menos indigesto para eleitores de centro-direita e de centro, de modo que é possível imaginar que esse eleitorado vai pensar bem se deixará de apoiar um candidato forte para desperdiçar um voto num candidato de terceira via que não tem chance de vencer e que poderia ajudar Bolsonaro, que está muito rejeitado devido ao que fez ao país, sobretudo na gestão da pandemia. Vamos ver", conclui ele.

Geraldo Alckmin (PSB) é oficializado vice-presidente na chapa de Lula (PT) para as eleições de 2022.

Há chances para a terceira via?

Para Michael Mohallem, advogado e professor do Instituto de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), há. Isso porque, historicamente, eleições presidenciais no Brasil costumam se aglutinar em torno de três ou quatro forças políticas.
A diferença para o atual cenário, que emula, ainda que parcialmente, as eleições de 2018, é que a perspectiva eleitoral do presente não é habitual.

"Essa polarização entre dois candidatos, com pouco ou quase nenhum espaço para uma terceira força na política nacional, é relativamente incomum. Em princípio, há espaço para uma terceira força política, ou terceira via. Com essa polarização, é natural que existam posições muito fortes e muito marcadas de rejeição a ambos os candidatos: um é criticado pela gestão nesses três anos e meio na Presidência; o outro, por ter sido associado com corrupção, o que não foi confirmado pela Justiça. Temos dois candidatos com rejeições altas, mas também com apoio, o que dificulta a entrada de outros candidatos. O que dificulta a subida de outros nomes também tem a ver com o 'voto útil' de um eleitor que, já no primeiro turno, tenta votar naquele que limita a chance e a perspectiva eleitoral do adversário. Muitos eleitores votam em Jair Bolsonaro por ele ser o único capaz de impedir, em tese, a eleição do Lula. O contrário também é verdade. São razões que limitam o espaço de atuação da terceira via", analisa o professor.

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Na avaliação dele, a formação de coligações partidárias mais amplas — caso dos quatro partidos do centrão se unindo para lançar uma candidatura única dentro de um mês — marca um indicativo para o eleitor de que votar na terceira via é factível.

"Já temos uma proporcionalidade para o fundo partidário e o fundo de campanha. Muitos partidos já saem na frente — caso do União Brasil, que formou bancada muito robusta pelo PSL na época da eleição do Bolsonaro, quando ele era do partido. Há uma atratividade a partir da capacidade de financiar campanhas. Quando esses partidos se fundem, caso do DEM e PSL, é natural que esse elemento torne as chapas mais atrativas. Há inúmeras pesquisas que mostram a correlação entre o quanto se investe em uma campanha e as chances de se eleger. Essa fusão é uma soma de recursos e de força", finaliza Mohallem.

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