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'Não conseguiremos avançar o acordo UE-Mercosul na presidência portuguesa', diz ministro da Economia

O ministro da Economia de Portugal, Pedro Siza Vieira, admitiu à Sputnik Brasil que o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul não deve avançar muito até o fim da presidência portuguesa do Conselho da UE, em 30 de junho. É a primeira vez que um integrante do governo português reconhece isso.
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Questionado pela Sputnik Brasil se a ratificação do pacto entre os dois blocos econômicos teria algum avanço ainda durante o mandato português na presidência rotativa, diante dos obstáculos atribuídos principalmente à política ambiental brasileira, Siza Vieira surpreendeu na resposta.

"Portugal está, neste momento, a priorizar as discussões ao nível do acordo com o Mercosul no âmbito da política comercial. Não creio que vamos conseguir fechar nem sequer avançar muito significativamente durante a nossa presidência. Mas continuaremos a defender, juntamente com a Espanha, que o processo tenha o andamento mais rápido possível", disse Siza Vieira.

O ministro separou cronologicamente os argumentos postos como entraves à celebração do pacto. De acordo com ele, no passado, as resistências ao Mercosul vinham sobretudo de setores econômicos, seja de produtores de carne da França, seja de produtores agrícolas de outra natureza, com receio da entrada na Europa de produtos alimentares do Brasil, Argentina e Uruguai. Mais recentemente, a preocupação ambiental passou a ser o fator preponderante.

"Desde a eleição do presidente [Jair] Bolsonaro, o tema são as práticas ambientais. Acho que há maneiras importantes de lidar com isso e de sensibilizar o mundo para a necessidade de políticas florestais, agrícolas, industriais, compatíveis com o meio ambiente. Mas a política comercial não deve ser usada como ferramenta para isso", defendeu.

No entanto, especialistas ouvidos pela Sputnik Brasil já afirmaram que é difícil dissociar o desenvolvimento econômico da sustentabilidade ambiental, sobretudo após o anúncio do Pacto Ecológico Europeu, em 2019, que pretende colocar a UE na vanguarda mundial de uma "diplomacia verde" e de "alianças verdes" com os países da América Latina, Ásia e Pacífico.

Para além disso, há resistências de países como França, Alemanha e Áustria na ratificação do acordo sob a justificativa de que a política ambiental do governo Bolsonaro aumentou o desmatamento da Floresta Amazônica. Em fevereiro, 65 eurodeputados enviaram uma carta a António Costa pressionando para que ele suspendesse o acordo com o Mercosul.

Em março, uma nova missiva endereçada ao primeiro-ministro português, dessa vez pelo vice-chanceler da Áustria, Werner Kogler, pediu que fosse evitada "qualquer manobra" para facilitar a votação do texto do tratado UE-Mercosul.

Nesta semana, 38 grandes supermercados e produtores de alimentos europeus ameaçaram boicotar produtos agrícolas brasileiros se for aprovado o projeto de lei 510/2021, que tramita no Senado Federal, também sob o argumento de que a legislação permitirá um aumento ainda maior do desmatamento na Amazônia.

Ainda assim, Siza Vieira defende a rápida assinatura e ratificação do acordo, alinhado com Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, que, no início da presidência portuguesa rotativa do Conselho da UE, havia dito que é uma obrigação dos 27 países do bloco concluir o acordo neste ano.

"Portugal, já há vários anos, é muito favorável a isso. Achamos que a Europa não pode estar ao mesmo tempo a defender mercados abertos regidos por regras que sejam juridicamente estruturadas e, depois, ter resistências à concretização de acordos de comércio livre como este, tão importante. Aliás, acho que daríamos um excelente sinal ao mundo se conseguíssemos reassegurar isso", acredita.

Conselho da UE avalia receber turistas já vacinados

As declarações foram dadas pelo ministro da Economia e da Transição Digital durante entrevista organizada pela Associação de Imprensa Estrangeira de Portugal (AIEP), na tarde desta sexta-feira (7).

A pedido da Sputnik Brasil, ele também comentou a evolução no debate a respeito do Certificado COVID-19 UE, um documento que pretende facilitar as viagens e a livre circulação de pessoas no bloco já a partir do início do verão europeu. O certificado seria dado a quem comprovasse ter completado a vacinação, ter anticorpos devido à recuperação da doença ou mesmo apresentasse um teste PCR negativo.

Siza Vieira revelou que, nesta semana, a Comissão Europeia apresentou duas novas propostas antes de o certificado entrar em vigor. A primeira é uma revisão da recomendação relativa a viagens não essenciais que tenham origem em países fora da UE, passando a aceitar, sem necessidade de quarentena, passageiros de países que tenham até 100 casos de COVID-19 por 100 mil habitantes. Portanto, quadruplica o limite atual, que é de 25 casos por 100 mil habitantes.

'Não conseguiremos avançar o acordo UE-Mercosul na presidência portuguesa', diz ministro da Economia

A segunda medida é passar a aceitar também passageiros que comprovem ter tomado, há mais de 14 dias, a segunda dose de alguma vacina reconhecida pela Agência Europeia de Medicamentos (EMA, na sigla em inglês) ou pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Ambas propostas estão sendo apreciadas pelo Conselho da UE, e o ministro espera que possam ser aprovadas nos próximos dias.

"Isso vai nos permitir abrir as portas a passageiros de várias origens muito significativas para voos não essenciais. Julgo que claramente esse vai ser o caso do Reino Unido, seguramente o caso dos Estados Unidos, do Canadá, e espero que, em breve, quando possível, possamos também passar a receber turistas brasileiros", exemplificou.

No entanto, o Brasil ainda está muito longe desse cenário. De acordo com os últimos dados disponíveis, em 6 de maio, havia 7.091,42 casos por 100 mil habitantes, e 197,11 óbitos por 100 mil habitantes no país.

Por outro lado, o ministro dos Transportes britânico, Grant Shapps, anunciou, nesta sexta-feira (7), que Portugal vai estar na "lista verde" de países considerados seguros para viajar e isentos de quarentena na chegada ao Reino Unido, a partir de 17 de maio, quando as viagens internacionais serão liberadas.

"Estou mesmo muito convencido de que no dia 17 de maio, quando os passageiros britânicos puderem voltar a viajar, Portugal vai poder acolher turistas britânicos sem outra limitação que não seja aquela mais leve. Agora, no Brasil, espero que isso venha a acontecer também em breve, mas não será no mesmo prazo", ratificou Siza Vieira.

Dificuldade de consenso sobre imposição de quarentena 

Ele explicou que as novas propostas da Comissão Europeia, que estão sendo analisadas pelo Conselho, surgiram após o Parlamento Europeu ter dado o sinal verde para o certificado, mas com algumas condições que ainda precisam ser aprovadas pelos Estados-membros. A primeira delas é o próprio nome, que passaria a ser Certificado COVID-19 UE, no lugar de Certificado Digital Verde, como havia sugerido a presidência  portuguesa.

A alteração na nomenclatura é o aspecto mais simples. No entanto, outros dois pontos devem encontrar dificuldade para aprovação. O Parlamento Europeu defende que os testes de detecção de COVID-19 sejam "universais, acessíveis e gratuitos" e que os Estados-membros não podem impor quarentenas ou testes-extra aos detentores do certificado.

"Acho que vamos ter um grande problema em conseguir algum consenso nessa matéria. A proposta [original] de regulamento permite aos Estados, independentemente da vigência do regulamento e de haver todos esses mecanismos, continuar a impor medidas preventivas, por exemplo, quarentenas. Portugal não concordou com isso, mas a presidência [portuguesa], para tentar obter um consenso no âmbito do Conselho Europeu, aceitou essa cláusula", explicou.

O ministro não evidenciou o posicionamento de Portugal quanto à questão dos testes gratuitos. No entanto, desde 15 de abril, a Câmara Municipal de Lisboa passou a disponibilizar testes gratuitos a todos os moradores e comerciantes das feiras e mercados de Lisboa, assim como aos seus empregados inscritos, por meio de um sistema de testagem rápida em massa com farmácias credenciadas. 

'Não conseguiremos avançar o acordo UE-Mercosul na presidência portuguesa', diz ministro da Economia

De acordo com Siza Vieira, a proposta da presidência portuguesa sobre o Certificado Digital Verde consistia basicamente na ideia de desviar o foco de atenção da origem dos passageiros para a circunstância individual de cada passageiro.

"Ou seja, não interessa tanto saber se uma pessoa é proveniente de um país onde a incidência está elevada ou baixa. O que interessa é saber se ela representa um risco de contágio. Por isso, deixar de focar em restringir voos de um certo país para passar a ter uma ideia de se o passageiro tem um certificado de vacinação, um teste negativo ou a possibilidade de mostrar que teve a doença há pouco tempo e tem um nível de anticorpos que lhe dá imunidade", detalhou.

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