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Sucateamento e omissão: médico aponta causas do agravamento da crise sanitária no Brasil

Falta de planejamento, problemas de gestão, sucateamento do sistema de saúde. Em entrevista à Sputnik Brasil, o especialista em saúde coletiva Deivisson dos Santos, da UFPR, analisou os motivos por trás da atual crise sanitária no país e na cidade de Manaus.
Sputnik

Nesta sexta-feira (15), o presidente Jair Bolsonaro isentou seu governo de responsabilidade pelo caos no Amazonas, dizendo que o mesmo fez a sua parte no que se refere à crise sanitária que afeta a cidade de Manaus. 

​A capital amazonense sofre com o colapso da saúde pública em meio a um expressivo aumento nos casos de COVID-19. Faltam leitos nos hospitais para atender os pacientes e faltam também cilindros de oxigênio para tratar os casos mais graves. Autoridades de diferentes níveis vêm adotando medidas paliativas para lidar com a crise, mas a situação permanece fora de controle.

Pacientes estão sendo transferidos, as Forças Armadas foram acionadas e até um pedido de socorro aos Estados Unidos já foi feito para ajudar na entrega de oxigênio, cuja escassez já provocou a morte de várias pessoas que estavam internadas em hospitais da cidade. 

​Para o médico Deivisson Vianna Dantas dos Santos, professor do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e coordenador do Mestrado Profissional em Saúde da Família da instituição, o que está acontecendo neste momento em Manaus e, em geral, no Brasil, é que a população está colhendo os frutos da falta de planejamento e gestão por parte principalmente do governo federal.

Em entrevista à Sputnik Brasil, o especialista explica que a atual crise observada no país seria "evitável" se as autoridades do setor tivessem realizado algum tipo de preparo para o enfrentamento de algumas das dificuldades impostas pela pandemia. Mas, infelizmente, segundo ele, não foi isso que aconteceu.

Em primeiro lugar, o professor destaca que, muito antes do início dessa fase mais aguda do surto do novo coronavírus no Brasil, profissionais e pesquisadores das ciências médicas já vinham alertando que a situação deveria piorar dentro de alguns meses, com base principalmente no histórico observado em outros países. O governo, no entanto, preferiu ignorar, afirmando, inclusive, que a pandemia já estava perto do fim.

​​De outro lado, ao longo da atual gestão, ocorreu também, ainda de acordo com Santos, um "sucateamento" grande do Sistema Único de Saúde (SUS), apesar da destinação de valores significativos para o combate ao surto da COVID-19.

"No início do ano de 2020, foi aprovado o famoso 'orçamento de guerra'. Foram, e vale a pena lembrar, R$ 500 bilhões para o enfrentamento da pandemia da COVID-19. Desses R$ 500 bilhões, apenas R$ 63 bilhões, mais especificamente, R$ 63,7 bilhões, cerca de 13% desse orçamento, foram destinados ao Ministério da Saúde. Além disso, a gente viu uma grande instabilidade dos ministros e da equipe técnica. Até hoje, a gente tem um ministro general que pouco entende de saúde pública." 

​Além de a pasta da Saúde ter recebido uma parcela pequena do montante destinado ao combate ao novo coronavírus, cerca de 37% desses valores nem chegaram a ser executados pelo ministro Eduardo Pazuello, segundo o professor. Prova desse sucateamento mencionado por ele seria o fato de que, para 2021, apesar da crise sanitária, o orçamento da União prevê um valor ainda menor do que o de 2020 para o Sistema Único de Saúde. 

"Em 2020, foi dada uma dotação equivalente a R$ 185 bilhões para o SUS. No orçamento de 2021, o SUS passa a ter R$ 123 bilhões apenas. Então, a gente vê que o quadro vai piorar no ano de 2021, porque pouco planejamento está sendo feito para equipar o nosso sistema de saúde para o que está por vir", argumenta o médico.

No que diz respeito à atual crise verificada no Amazonas especificamente, para o especialista, além desse cenário de falta de planejamento e sucateamento, ele considera que houve também uma omissão grave por parte do poder público em Manaus.

"A gente estava vendo, no mês de dezembro, um aumento do número de casos. Nós, especialistas da saúde coletiva, indicamos lockdown para aquele município e isso não foi realizado. E a gente está vendo a explosão de casos aí, hoje. É uma omissão em termos de políticas públicas que pode ser considerada criminosa."

​A pandemia, de acordo com Deivisson Vianna Dantas dos Santos, teve o poder de desestruturar o sistema de saúde brasileiro, afetando também diversos tipos de serviços e cuidados não relacionados à COVID-19. E essa é outra questão também deve ser tratada com preocupação, já que, possivelmente, alguns desses problemas negligenciados ao longo desse período poderão, mais à frente, também provocar um número significativo de mortes e agravamento de quadros de saúde.

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