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EUA tentam dividir os BRICS convidando Brasil, Rússia e Índia para o G7, diz especialista

Jair Bolsonaro anunciou que o Brasil foi convidado pelos EUA para fazer parte do G7. Para discutir o assunto, a Sputnik Brasil ouviu o professor de Relações Internacionais, Leonardo Trevisan, que afirma que o convite pode ser uma tentativa de minar os BRICS no pós-pandemia da COVID-19.
Sputnik

Na segunda-feira (1º), Bolsonaro afirmou após conversa com o presidente norte-americano, Donald Trump, que o Brasil foi convidado para integrar a versão expandida do G7. Sabe-se que Donald Trump também planeja enviar convites para Rússia, Coreia do Sul, Austrália e Índia.

Para Leonardo Trevisan, professor de Relações Internacionais da ESPM-SP, especialista em História das Relações Internacionais e em Geoeconomia Internacional, a possível entrada do Brasil no grupo é "sem dúvida" relevante para o país.

"A integração do Brasil ao G7 expandido, como está sendo chamado é relevante, tem importância e, de fato, a participação brasileira dá visibilidade para a participação internacional do Brasil", diz o especialista em entrevista à Sputnik Brasil.

Apesar disso, o professor afirma que ainda é necessário aguardar a confirmação do convite, uma vez que até agora há apenas uma publicação em redes sociais do presidente brasileiro sobre o assunto.

"Isso já aconteceu antes, e as coisas não se confirmaram completamente", aponta.

Brasil em evidência pode ser inconveniente

O especialista avalia que o convite ao Brasil em um momento de crise política, econômica e sanitária, é delicado. Para ele, o país ficará em evidência internacionalmente, e as posições diplomáticas brasileiras serão lembradas.

"A posição do Brasil principalmente no que diz respeito a problemas climáticos, a problemas de meio ambiente, à preservação ambiental, são posições que não deixaram o Brasil em uma situação confortável no mundo", diz.

As posições brasileiras em relação à pandemia da COVID-19, segundo Trevisan, também podem trazer constrangimentos ao Brasil em um momento em que o país esteja em evidência no âmbito internacional.

"A visão que o Brasil tem, a posição que o Brasil teve em relação à pandemia, o tratamento, um certo distanciamento daquilo que eram as posições mais fortes, mais precisas da Organização Mundial da Saúde [OMS] também deixaram o Brasil em uma posição não necessariamente confortável. A mídia internacional vai cobrar essa posição", ressalta.
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Essa "cobrança", lembra Trevisan, parte não apenas de mídias progressistas, mas também como o Financial Times e a The Economist, que são críticas ao atual governo brasileiro.

"[A visão desses jornais] em relação às posições do governo brasileiro, em relação a certas expressões do presidente Bolsonaro, não são as mais convenientes. Tudo isso será lembrado em um momento em que o Brasil alcance uma projeção para estar sentado nessa mesa [do G7]. Talvez, de algum modo, fosse melhor que nós tivéssemos uma posição mais próxima a um certo multilateralismo, que abandonássemos um pouco uma crítica tão forte a posições multilaterais para voltarmos a essa projeção internacional", aponta.

Tentativa de divisão dos BRICS?

Os convites a Brasil, Rússia e Índia chama a atenção por incluir três membros dos BRICS. Trevisan ressalta que a ausência de convite à África do Sul e principalmente à China, teria como função a divisão dos BRICS.

"Os BRICS serem chamados apenas em 3/5 deles - vamos imaginar que se confirma o convite ao Brasil, Rússia e Índia - deixando de lado a China e a África do Sul, funcionaria como uma espécie de divisão dos BRICS. Isso não é uma posição muito favorável. A posição do Brasil em relação à China, por exemplo, é uma posição bastante, vamos dizer dessa forma, significativa. Hoje a mídia brasileira aponta que a China alcançou praticamente 40% das exportações do país. É o nosso grande freguês", afirma.

Trevisan acredita que posições internacionais brasileiras em relação à China são inconvenientes e até perigosas, dado o contexto de proximidade econômica entre os países.

"Essa proximidade econômica tem mantido a crise cambial longe do Brasil. Essa posição com a exportação brasileira, como os dados da OMC [Organização Mundial do Comércio] sinalizaram, deixaram o Brasil como o único país ainda que tem uma posição superavitária, mínima, mas superavitária exatamente por conta dessas exportações à China", explica.
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Nessa toada, Trevisan aponta que uma aproximação mais intensa com os Estados Unidos em detrimento da China, será prejudicial para economia brasileira.

"Se o Brasil tomar uma posição nessa disputa China-Estados Unidos, uma posição muito francamente pró-americana, inclusive com aproximações diplomáticas deste poder, não será conveniente para o futuro econômico do país. Isso é indiscutível", avalia.

Por isso, a visão do especialista é de que a ida do Brasil ao G7 traria prejuízos à relação do país com a China.

"Seria conveniente que o Brasil, exatamente pelos vínculos econômicos que tem, preservasse um bom entendimento com a China. Sentar-se em uma mesa que exclui a China não será bem compreendido por Pequim", diz o professor.

O novo mundo pós-pandemia

A crise econômica causada pela pandemia da COVID-19 aponta para a formulação de novos laços e relações comerciais entre os países no momento seguinte. Para Trevisan, essa crise aumenta o impacto de reuniões como as do G7 e do G20.

"Há uma nova relação comercial que vai se estabelecer nesse processo pós-pandemia. Há uma outra relação de protecionismo entre os países que precisará ser vencida, rediscutida. Essa mesa dessa reunião terá esse poder já no imediato pós-pandemia de abrir essa discussão", aponta.
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E é justamente pelas necessidades que se impõem de reorganizar as relações internacionais após a COVID-19 que a presença da China se torna fundamental, diz o professor.

"O Brasil não poderia estar de fora, é evidente que seria uma situação muito ruim. Mas é pior ainda nós excluirmos o segundo PIB dessa reação. Não podemos esquecer que a atuação de Putin, a atuação da Rússia, de Vladimir Putin, lembrará a todos os presentes nesta reunião que há uma aliança já construída, e bem construída, entre Pequim e Moscou. Isso terá o seu preço e isso terá a presença lembrada nesta mesa. Não é conveniente de forma alguma que nós rediscutamos o futuro excluindo a segunda potência", conclui.
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