Estaria Israel empurrando Irã para fora da Síria?

Coberto pela tempestade mediática do coronavírus, Israel está intensificando sua campanha de bombardeio de alvos iranianos na Síria.
Sputnik

Ao ponto de convencer Assad de que o Irã é um fardo para seu país? Gil Mihaely, grande conhecedor da geopolítica israelense, analisou para a Sputnik França a estratégia de Tel Aviv na Síria.

Enquanto a atenção do mundo está voltada para a pandemia do novo coronavírus, Israel avança sem alarido seus peões no Oriente Médio. Desde 2012, o Estado judeu tem bombardeado regularmente alvos do Hezbollah e iranianos na Síria. Contudo, recentemente, os bombardeios aumentaram em intensidade e frequência.

Campanha que os militares israelenses apresentaram como uma vitória sobre o Irã e que levou mesmo o jornal Times of Israel a anunciar em manchete a retirada iraniana da Síria "sob os golpes de Israel" e o ministro da Defesa israelense a proclamar que, para Assad, o Irã se tornou em um fardo.

"Mas a realidade – como muitas vezes acontece em tempos de guerra – é muito mais complexa", prosseguiu Gil Mihaely, editor das revistas Causeur e Conflits que comenta regularmente sobre política e geopolítica israelense nas mídias.

Israel se vangloria

Segundo ele, este triunfalismo é, acima de tudo, uma estratégia de política interna, para consumo do público interno.

"Em Israel, só a imprensa de direita fala de uma vitória sobre o Irã na Síria. As mídias do centro e de esquerda não escrevem sobre isso. Os analistas mais sérios sobre estas questões são muito mais cautelosos."

Para o especialista, foi o ainda ministro da Defesa, Naftali Bennett, que é próximo à direita nacionalista e em breve deixará seu posto, "quem informou a imprensa na esperança de que isso melhorasse sua imagem e o fizesse parecer o homem que derrotou o Irã na Síria".

Estaria Israel empurrando Irã para fora da Síria?

Seja como for, os recentes bombardeios seguem uma lógica estratégica israelense bem definida, visando sobretudo dois objetivos:

O primeiro "é o de evitar que o Hezbollah adquira mísseis de alta precisão fornecidos pelo Irã via Síria, o que lhe permitiria atingir centros urbanos e instalações militares em Israel", segundo Mihaely.

O segundo objetivo "é o de evitar a todo custo a transferência de tecnologia que permitiria ao Hezbollah construir seus próprios mísseis de alta precisão", ou seja, pretende-se que o "Hezbollah não possa comprar mísseis nem adquirir conhecimento para os obter".

Prova disso é o ataque aéreo que ocorreu em 4 de maio contra um centro de pesquisa a sudeste de Aleppo. Segundo Gil Mihaely, este centro é colocado à disposição das forças hostis a Israel precisamente para permitir esta transferência de tecnologia, embora oficialmente não haja confirmação disso.

Estratégia Israelense

Enquanto vidas e propriedades são regularmente destruídas por esses bombardeios, não há qualquer indicação de que o Irã esteja se retirando na Síria.

Aliás, segundo o especialista, "o Irã atingiu seus dois principais objetivos na Síria, a saber, manter Assad no poder e fortalecer o Hezbollah no Líbano através da Síria".

Por sua vez, Tel Aviv tenta a todo custo semear a ideia de que para a Síria o apoio iraniano é, acima de tudo, um fardo. Esta é a essência da linha de conduta de Israel, que não deseja intervir militarmente na Síria além de alguns ataques aéreos.

"A estratégia israelense é eliminar fisicamente os perigosos elementos iranianos na Síria, mas há também uma mensagem enviada a Assad e Putin: nós [Israel] temos interesses vitais, e não podemos ter outro vizinho vassalo do Irã depois do Líbano. O Tsahal [Exército de Israel] está, assim, tentando fazer Moscou e Damasco entender que o apoio iraniano é mais um fardo do que qualquer outra coisa", enfatiza o especialista em política israelense.

Gil Mihaely opina que Síria e Israel poderiam voltar a uma forma de vizinhança cordial, como foi o caso entre 1974 e 2011, se bem que nunca no curto ou médio prazo.

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