China 'não é único lugar a ser culpado' se laboratório de Wuhan liberou coronavírus, diz cientista

Em meio a acusações feitas por altos responsáveis dos EUA contra o Instituto de Virologia de Wuhan, uma microbiologista afirmou que pode haver um grão de verdade nas afirmações.
Sputnik

A Dra. Dady Chery, microbiologista e coeditora-chefe do portal News Junkie Post, falou à Sputnik Internacional na segunda-feira (4) para explicar por que ela discorda da afirmação de que o novo coronavírus é um produto da natureza, ao invés de ser produzido em laboratório.

"A China não é o único lugar a ser culpado por isso", observou. "Eu acho que o Instituto de Virologia de Wuhan esteve quase certamente envolvido na pesquisa do SARS-CoV-2, mas o Instituto de Tecnologia de Wuhan foi na verdade construído com ajuda francesa por US$ 42,4 milhões [R$ 236,5 milhões]."

Ela afirmou que a China teve desde o início uma série de parceiros internacionais auxiliando os esforços do Instituto de Virologia de Wuhan. Chery explicou que, de acordo com o site do laboratório, cientistas da França, EUA, Canadá, Reino Unido, Austrália, Espanha, Alemanha, Países Baixos, Japão, Singapura, Paquistão e Quênia têm estado dentro das instalações altamente seguras.

Além disso, sua lista de parceiros financeiros inclui a União Europeia, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Aliança EcoHealth, estabelecida sob um projeto da Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em inglês).

Chery destacou que a Aliança EcoHealth "financia a busca de patógenos muito, muito desagradáveis em animais, e em humanos, e trazê-los para laboratórios de biossegurança nível quatro [BSL-4] para pesquisa".

Ela acrescentou que existem apenas cerca de 30 laboratórios BSL-4, que apresentam o mais alto nível de precauções de biossegurança e que lidam com esse tipo de pesquisa.

China 'não é único lugar a ser culpado' se laboratório de Wuhan liberou coronavírus, diz cientista

"Nenhum cientista legítimo pode realmente verificar suas pesquisas, a menos que eles também tenham acesso a um laboratório BSL-4 e queiram correr esse tipo de risco", disse ela.

Possíveis parentes do novo coronavírus

Em relação ao próprio vírus, Chery explicou que, das 16 proteínas presentes nele, a proteína do espigão é o ponto focal dos cientistas. Esta proteína em particular é a responsável por reconhecer a proteína receptora na superfície das células humanas, para que ela possa entrar nelas.

Segundo a OMS, o novo coronavírus é de "origem animal" e não foi "manipulado ou construído em laboratório ou em qualquer outro lugar". Embora muitos tenham atribuído a negação pelo presidente norte-americano Donald Trump da declaração da OMS e sua retórica anti-China a nada mais do que xenofobia, é possível que ele esteja correto sobre a origem do vírus.

Chery observou que quando se trata do SARS-CoV-2, crê-se que seu parente mais próximo é o SARS-CoV, que foi identificado em 2002 e causa a síndrome respiratória aguda grave (SARS).

No entanto, os dados de sequência genética publicados por investigadores chineses mostraram que o RaTG13, um tipo de coronavírus de morcego, é o parente mais próximo do SARS-CoV-2.

"O único problema com isso é que a principal semelhança entre [o RaTG13] e o SARS-CoV-2 está na proteína espigão. O vírus tem muito mais coisas", apontou.

Chery afirmou que os cientistas de Wuhan têm assento nos conselhos editoriais de seis revistas científicas diferentes e são incrivelmente poderosos na comunidade científica, pois "dão dinheiro para cientistas de todo o mundo".

Evidências inconclusivas

No entanto, disse ela, o virologista francês e prêmio Nobel da medicina Luc Montagnier argumentou que há sequências de HIV presentes no SARS-CoV-2, o que não é provável que aconteça em algo que ocorre na natureza.

"Eu não acreditei apenas na palavra dele", frisou Chery. "Eu li mesmo os artigos [referenciados]."

Vale ressaltar que os comentários de Montagnier têm recebido a oposição de muitos de seus colegas, incluindo Jean-François Delfraissy, imunologista e chefe do conselho consultivo do governo francês para a COVID-19.

Delfraissy disse, falando à emissora francesa BFM TV, que a hipótese de que a SARS-CoV-2 foi feita em um laboratório soa como "uma visão conspiratória que não se relaciona com a ciência real".

Comentar