Como Vietnã vai reagir à pressão informacional dos EUA?

Recentemente, prestigiadas publicações dos EUA têm divulgado cada vez mais artigos sobre os benefícios de uma aliança militar do Vietnã com os EUA.
Sputnik

A Sputnik Vietnã fez uma análise sobre os propósitos reais da possível aliança entre os dois países e os desafios que pode enfrentar o lado vietnamita.

A agência Bloomberg, através do almirante aposentado norte-americano James Stavridis, propõe, "não um tratado de defesa em grande escala como com a Tailândia ou as Filipinas, mas um forte acordo informal de cooperação na área de segurança".

Já o National Interest uma aliança militar com os EUA como a única garantia de segurança do Vietnã, e lamenta que a famosa política do "três nãos" (política de cooperação com os países mais desenvolvidos, mas sem acordos militares de qualquer tipo) de Hanói, que o país segue por muitas décadas, o impeça de concluir tal aliança.

Apesar das diferenças nos níveis propostos de cooperação em defesa entre os dois países, os autores de todos os artigos na mídia dos EUA são unânimes em uma coisa: os EUA são o único país no mundo que pode derrotar a China e salvar o Vietnã de suas pretensões, especialmente porque ambos os países já viraram a página pesada da história comum, cheia de hostilidade, ódio e amargura. Também segundo o almirante Stavridis, "os vietnamitas, desde as mais altas instâncias de poder até às pessoas na rua, têm um amor sincero pela América".

"O fato de a mídia americana ter começado a trabalhar ativamente o tema da aliança militar do Vietnã com os EUA indica que eles receberam essas ordens de Washington", considera Vladimir Kolotov, chefe do Departamento de História do Extremo Oriente da Universidade Estatal de São Petersburgo.

"Estes artigos são imediatamente traduzidos para o vietnamita e divulgados na sociedade vietnamita, e há terreno fértil para estas ideias no Vietnã. Os EUA são muito competentes na organização de campanhas de informação, levando-as corretamente ao destinatário, e têm uma relação muito próxima entre os negócios, a política e o trabalho de informação", relata o especialista.

"Há que admitir que a China fez tudo o que estava ao seu alcance para virar a opinião pública no Vietnã contra si própria. A sua política contraproducente, na minha opinião, no mar do Sul da China, empurra metodicamente o Vietnã para a zona de influência predominante dos Estados Unidos", assume Kolotov.

Qual é o propósito de tal aliança para os EUA?

Os EUA estão interessados em desestabilizar a situação na região, diz o professor Vladimir Kolotov.

Anteriormente, Washington estava empenhado em desestabilizar a Europa, o Oriente Médio, o Cáucaso, a Ásia Central e a África, mas a Ásia Oriental permaneceu fora de seu foco. A região tem permanecido estável durante demasiado tempo e adquiriu um tal poder econômico, político e militar que os principais intervenientes estão a desafiar os próprios EUA.

Como poderiam os Estados Unidos gostar disso? Este é um jogo geopolítico sério. Se o Vietnã começar a cooperar com os EUA, ele resolverá alguns problemas, mas surgirão outros. Agora o Vietnã tem um grande superávit na balança comercial com os EUA, que compensa seu défice no comércio com a China.

Mas os EUA não estão satisfeitos com isso, e a tradição política dos EUA é fazer exigências e defender estritamente os seus interesses, algo que Donald Trump faz com muita competência. Todos nós vemos como ele faz isso com a China, o Japão e a Europa, que é obrigada a comprar gás americano um terço mais caro que o da Rússia porque tem "moléculas de liberdade".

Como Vietnã vai reagir à pressão informacional dos EUA?

Os americanos são muito bons a vender influência. E se o Vietnã "caiu na dependência" da exportação de seus produtos para os EUA, ele terá que pagar por esse bônus. Os EUA apresentam sua "lista de preços": praticar uma política que seja benéfica para os EUA. O que é favorável para os EUA, isso se vê nos acontecimentos na Síria, na Líbia, no Iraque, na Iugoslávia ou na Ucrânia.

Os interesses do Vietnã ficariam realmente protegidos?

No Sudeste Asiático os Estados Unidos têm parceiros de segurança leais e de longa data, tais como as Filipinas e a Tailândia. Mas, em 2017 os americanos não responderam a um pedido de assistência contra militantes do Daesh (organização proibida na Rússia e em muitos outros países) que haviam tomado uma cidade nas Filipinas, então o presidente Duterte foi a Moscou para obter armas modernas.

A aliança com os EUA também não ajuda a Tailândia a combater os separatistas islâmicos no sul do país, e no futuro próximo não vai ajudar quando começar o próximo teste de fogo dos regimes do Sudeste da Ásia no combate aos militantes do Daesh. Foram os americanos que afastaram os jihadistas radicais dos ataques das Forças Aeroespaciais russas para o Paquistão e Bangladesh, de onde eles se estão infiltrando em Mianmar, Tailândia e Filipinas.

Poucas pessoas se lembram da inação dos americanos em 1974, quando a China tomou as ilhas Paracel, o que parecia fazer parte do acordo dos EUA com a China em 1972 para transferir Pequim para o campo antissoviético. Os EUA também se calaram em 1988, quando os chineses começaram a infiltrar-se nas ilhas Spratly (arquipélago desabitado entre as Filipinas e o Vietnã). Agora Washington precisa de uma configuração diferente na região.

"A política seguida pela liderança vietnamita nas últimas décadas tem sido extremamente bem-sucedida para o país. O Vietnã ganhou em conflitos assimétricos com atores muito mais poderosos graças a uma estratégia muito flexível e competente. Isto é evidenciado pelas guerras na Indochina, pelo Khmer Vermelho [organização comunista no Camboja] e pela guerra fronteiriça de 1979. Esperamos que a liderança vietnamita seja capaz de encontrar a solução certa", resume o perito russo.
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