Como China e Estados Unidos disputam influência na África

Uma nova linha ferroviária eletrificada atravessa o deserto africano, traçando um curso que sai um porto, ao longo da costa de Djibouti em direção a Addis Abeba, a capital da Etiópia, que não tem litoral.
Sputnik

Os chineses construíram a ferrovia e parte do porto, além da nova base militar ao lado. No outro extremo da linha, os dólares chineses financiaram os novos trilhos leves que partem de Addis Abeba e o novo sistema rodoviário, além da própria sede da União Africana, que se eleva sobre a cidade.

Do outro lado do Oceano Atlântico, os Estados Unidos perceberam. Com informações da Associated Press, este artigo analisa uma disputa que vem se desenhando na África.

Do Djibouti à Etiópia, do Quênia ao Egito, os Estados Unidos estão soando o alarme avisando que o dinheiro chinês que inunda a África vem com uma contrapartida significativa. 

Os avisos trazem tons neocoloniais: dizendo que com os surpreendentes investimentos de Pequim em portos, estradas e ferrovias, viriam também a dependência, a exploração e a intrusão na soberania básica das nações.

"Não estamos de forma alguma tentando manter os dólares de investimentos chineses fora de África. São muito necessários", afirmou o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, nesta semana na capital etíope. "No entanto, pensamos que é importante que os países africanos considerem cuidadosamente os termos".

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Esses termos levam a negócios em que os trabalhadores chineses, e não os africanos, adquirem os empregos de construção, afirmam Tillerson e outros funcionários dos EUA. Eles dizem que as empresas chinesas, ao contrário dos norte-americanos, não cumprem as leis anti-suborno, alimentando os problemas já existentes na África com a corrupção. E se os países enfrentam problemas financeiros, eles muitas vezes perdem o controle sobre sua própria infraestrutura por inadimplência para um credor que historicamente nem sempre teria sido dado ao perdão.

Alguns países africanos agora devem somas que chegam ao dobro da sua produção econômica anual, disseram os EUA, com a maior parte da dívida voltada aos chineses. Em Djibouti, a dívida totaliza aproximadamente 84% do PIB, afirmou o ministro das Relações Exteriores, Mahamoud Ali Youssouf, nesta sexta-feira (9).

"Nós não estamos preocupados", disse Youssouf, ao lado de Tillerson, enquanto o diplomata dos EUA visitou o pequeno país costeiro. "Nenhum país pode desenvolver-se sem ter uma infraestrutura forte. E a China é, nessa perspectiva, um parceiro muito bom".

Há razões óbvias para que os Estados Unidos desejem lançar a si e a suas empresas como uma alternativa mais favorável à China, o rival geopolítico e competidor econômico cuja influência também está em ascensão na América Latina, Europa e Oriente Médio.

Linha férrea parte de Mobassa, no Quênia, em direção a Nairobi, capital do país. O projeto foi considerado o maior projeto de infraestrutura do país, e foi financiado pela China com cerca de 3,3 bilhões de dólares. O linha foi construída com planos de estender-se até o Oceano Índico.

Mas há um problema, afirmam políticos e economistas africanos: a China, ao contrário dos Estados Unidos, está aparecendo no continente com um generoso talão de cheques. Dada a imprevisibilidade envolvida no investimento em países mais pobres, a China é muitas vezes a única que está disposta a assumir o risco.

E as nações africanas percebem que os investimentos da China não vêm com a mesma preocupação sobre direitos humanos e boa governança, que muitas vezes acompanha a assistência dos Estados Unidos.

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"Eles estão prontos para fazer negócios, basicamente", disse Brahima Coulibaly, ex-economista do Federal Reserve e especialista em África da Brookings Institution. "Eles estão prontos para fazer parceria com qualquer país que também esteja disposto a ser parceiro deles de forma que seja sensível para eles e promova sua agenda".

A China refuta com veemência a ideia de que suas empresas na África ou em outros lugares são exploradoras, argumentando que sua generosidade ilustra seu compromisso com o resto do desenvolvimento econômico e social do mundo.

"Ninguém domina, e todas as partes participam em pé de igualdade", disse o ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, em sua conferência de imprensa anual na quinta-feira (8). "Não há operação secreta, mas uma operação aberta e transparente — ninguém leva tudo, mas todos veem benefícios mútuos e resultados na chave ganha-ganha".

Os investimentos visíveis através da iniciativa Nova Rota da Seda (One Belt, One Road) da China, que devem chegar aos trilhões de dólares, formam apenas uma parte da tentativa do poder asiático de promover um novo sistema global que coloca Pequim no centro. Igualmente alarmante para os EUA são os projetos militares da China.

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Em Djibouti, a China construiu sua primeira base no exterior ao longo da rota que liga Europa e Ásia. Seu plano de "cordas de pérolas" exige a construção de uma rede de portos que se estendem da China ao Golfo Pérsico. Pequim também tem se ocupado com a construção de ilhas artificiais e, em seguida, tomará medidas para militarizá-las em uma tentativa de ampliar seu controle sobre as águas distantes de sua costa.

A nova base da China no Djibouti, outro país imensamente em dívida com Pequim, está a apenas alguns quilômetros da única base militar permanente dos EUA na África. Apesar de ser a única base africana da China até agora, o general Thomas Waldhauser, chefe do Comando norte-americano dos Estados Unidos, previu esta semana que "haverá mais".

"Não somos ingênuos de pensar que algumas das atividades que os chineses estão fazendo em termos de contra-inteligência lá já estão ocorrendo", disse Waldhauser ao Comitê de Serviços Armados da Câmara dos EUA. "Mas isso significa que temos que ser cautelosos, temos que estar de guarda".

Para melhor ou pior, as suspeitas dos EUA sobre as ambições da China estão indo muito além dos limites da África. As empresas chinesas estão construindo ou financiando usinas elétricas no Paquistão e no Quirguistão, gerenciando um porto na Grécia e lançando projetos ferroviários na Tailândia e no Tajiquistão, com planos agressivos para continuar sua expansão para a América Latina.

No entanto, já há casos preocupantes, dizem os críticos.

No Sri Lanka, o ex-presidente sofreu uma derrota surpresa na eleição em 2015 depois que seu oponente criticou-o por ter gerado cerca de US$ 5 bilhões em dívida com a China para financiar o setor de construção. Em dezembro, o governo do Sri Lanka vendeu uma participação de 80% no porto de Hambantota para uma empresa estatal chinesa depois de atrasar o pagamento de US$ 1,5 bilhão, emprestados para a obra.

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Na África, algumas das estradas financiadas pela China começaram a desmoronar, disseram os EUA, devido à construção de má qualidade. E em janeiro, o jornal francês Le Monde informou que a China plantou dispositivos de escuta na sede de US $200 milhões que construiu para a União Africana em 2012. A China nega essas acusações.

A disputa pela influência no continente, no entanto, deve continuar. Os EUA mantêm atividades militares principalmente no norte africano, enquanto os chineses têm presença cada vez maior nas empresas e na vida política de diversos países ao longo do território africano.

A África tem crescido muito nos últimos anos, e também tem uma população que aumenta de forma veloz, ao contrário da maior parte do mundo. O continente também deve ser importante nas próximas décadas, devido ao potencial produtivo de sua agricultura e ao aumento exponencial da população da terra.

China e Estados Unidos sabem de tudo isso e, de uma forma ou de outra, não podem virar as costas para o continente original.

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